Minha escrita

Não escrevo para os outros. São os meus fantasmas que espreito, flerto, tento espantar. Escrever para mim é o fim; não o meio. Escrevo sobretudo para tentar me localizar no tempo, no espaço, nas emoções.

Nessa empreitada meu cérebro é um ouvinte atento. Ele escreve o que o coração dita. Só quando escrevo tecnicamente me permito não seguir essa regra tão à risca. Isso em nome da razão e do bom senso. Mas, entre nós, mesmo o texto técnico deve ter textura, cor e profundidade. E isso só se consegue com o coração.

Caso quisesse escrever apenas com o cérebro, isso resultaria num texto vazio. Falo daquela escrita que se faz para agradar aos outros, com o intuito de vender-se, como um produto de marketing pessoal. Essa escrita, mesmo bem elaborada ou erudita, não agrada verdadeiramente a ninguém, nem ao seu próprio escritor quase sempre. Talvez por essa razão raramente faço citações. Não acho que a transcrição de uma bela frase vá melhorar meu conteúdo nem dar-me prestígio. Ao contrário, se necessito do socorro alheio é porque justamente me faltam conteúdo e prestígio.

Mas mesmo o coração precisa de regras. Poucas, é verdade, mas necessárias. Então busco a escrita cujo conteúdo traga misto de prazer e desconforto e, em sua forma, seja breve e inteligível.

Disse antes que não escrevo para os outros. Não é bem assim. Sou, sim, um mendigo com a mão estendida esperando um comentário, um elogio, um aplauso. Mas este sou eu; não minha escrita.