Casos & Cachos

De Chorinho em chorinho, sobrou-nos apenas um chororô, um dramalhão, sem referências a Buarque, Burlesco ou Bar. Um barco. Não. Uma barca. Um auto da Barca Infernal? Deus me livre! Não. Com certeza, não. Somos apenas personagens novos, em busca de um lugar ao sol. DO-RÉ-MI-FÁ-SOL. Sol! Sol que brilha! Sol q nos alumia no friozinho de outono. Outono que outrora nos disse que o inverno não chegaria. E não chegou, para nós.

Falar dos “zoim” com preguiça de abrirem aos domingos, é no mínimo esboçar um quadro perfeito, se juntarmos a boca cálida e os belos dentes; a pinta no queixo que a deixava tão singular, saberíamos que o mundo não é perfeito, porém, agradável. Quanto cabelo! Todos misturados e cacheados. Um todo pedindo água e sabão, um banho para rejuvenescer velhos amantes.

O corpo se esticou todo, estalou-se como casa-velha, levantou-se magra, com olhos ainda mais magros, discretíssimos olhos magros, olhos de ressaca, não os de Capitu, mas sim ressaca de vinho tinto barato.

O chuveiro ligado orquestrava sua voz baixa, fraca e infantil num arremedo de Bossa antiga. E eu, ainda estirado na cama, feito derrotado em guerra, pois Patrícia odiava qualquer presença pela manhã.

Desligou o chuveiro e trovejou sobre a água fria. “Preciso ir” resmungou mostrando-me a face renovada – Ela era mais bonita com batom – “ Estou cansada”. Em sua frases não se permitia interrogações ou exclamações. Sempre se afirmava. “ Quero um café”, levantei-me e fiz de seu desejo, ordem. “ Emagreceu. Está fumando demais.” Apaguei o cigarro que me era tão automático com o aroma de café. “ Preciso ir.” Continuou enquanto a cabeça inclinada deixava os longos cabelos serem massageados pelas pontas da toalha. “ Estou cansada.”

“O café. O café está pronto.” Dei-lhe a xícara predileta. “Precisa de mais pó” – e do pó se fez o homem – “Preciso ir” disse arrumando as poucas coisas. “ Estou cansada.” Concluiu. Já pronta e com as coisas na bolsa de mão. “ Me vou. Estou cansada.” Disse atravessando a porta. Acenei, mas as costas não possuíam olhos, e me sobrou apenas o estalo da porta fechando.

Patrícia era assim, havia ouvido falar, ela vem e vai, mas quando cansa, é a mesma coisa de um Adeus. E ela se cansava para todos. Ninguém nunca a questionara, sabiam que era o ciclo natural das coisas.

O poder de inibir terceiros, silenciava qualquer dialogo, mas eu precisava da verdade, e decidi interrompe-la na escadaria rumo a ida sem volta. “Patrícia, não vá!” ela me olhou com espanto e me deu o privilégio da exceção “ Preciso ir. Estou Cansada.” Perguntei estremecido “Porque?” e com a sinceridade que sempre lhe foi dádiva deixou seu destino claro: “ Estou cansada. Sempre cansada. Preciso ir.” E ela se foi.

Lucas M Franciscon
Enviado por Lucas M Franciscon em 19/05/2011
Reeditado em 20/05/2011
Código do texto: T2980790