PARTE TERRESTRE

Num barco taxi fomos para o hotel vizinho à praça de S. Marcos. No centro velho de Veneza, a história escorre pelos canais e pelos pórticos antigos.

Cada detalhe remete o visitante embevecido a vários séculos no passado enevoado por lendas e pelo orgulho dos venezianos de ser a única cidade europeia que jamais foi dominada pelo invasor. O mar Adriático é o aliado e principal artífice desse feito. O leito lamacento de seus canais de pouca profundidade segurou os barcos que se aventuraram por canais que só os nativos sabiam usar. Encalhados, quaisquer naus de guerra, por mais armada que esteja, vira alvo de fácil destruição.

Murano é uma das ilhas onde a indústria do vidro está instalada desde tempos imemoriais.

Todo transporte público ou particular se faz com um pé no cais e outro no barco e o céu de Veneza é salpicado de albatrozes que se misturam aos pombos da praça.

O café Florestam, o mais antigo da Europa, pois funciona ininterruptamente desde o ano 1700, oferece aos usuários e transeuntes um espetáculo de música, da boa música italiana, tocada por artistas trajados de gala, executando instrumentos que misturam a nossa conhecida sanfona ao piano de cauda, violino, oboé e trombone de vara.

A vista panorâmica da torre na praça de S. Marcos, as galerias de arte e os museus que guardam as “novidades” trazidas da China por Marco Polo, o palácio do Doge, governante eleito, que não devia obediência ao rei, a igreja de S. Marcos, a ponte Rialto e a ponte dos Suspiros (quase totalmente coberta pelos tapumes da restauração), são locais de visita obrigatória.

Na sala Egito do Museu Correr, a estátua de Anúbis (o deus chacal), esculpida em basalto negro, acompanha com o olhar severo da morte, aos que se aproximam das múmias enfaixadas com papiro e cobertas com a máscara mortuária, esculpida em madeira policromada, ricamente ornada com pedras e ouro.

O ônibus, por estradas incrivelmente bem conservadas apesar do tráfego pesado intenso, nos levou para Firenze que é uma grande galeria de arte a céu aberto. Michelangelo estudou e trabalhou lá durante boa parte de sua vida.

Visitamos o mercado público com a estátua do javali de bronze (símbolo da cidade), a igreja Duomo, o panteão, a Fontana de Trevi e a casa de Pinóquio.

A cada passo, uma igreja demonstra a influência do catolicismo na vida daquela gente.

Em Roma, o mergulho na história.

Tudo em Roma é antigo e tem importância histórica, pelo menos para nós ocidentais, pois a cultura romana, influenciada pela cultura grega, depois que a Grécia foi incorporada ao império e os gregos feitos escravos, se tornou o berço de várias culturas, entre elas, a nossa.

As sete colinas, o fórum, o coliseu, Sant Ângelo, Arco de Constantino, a igreja de S. Pedro, o monumento à nacionalidade onde Vitório Emanuelle II é diariamente reverenciado pelos nativos e visitantes ilustres.

O trabalho dos arqueólogos desenterra templos, fóruns, termas, residências com mais de dois mil anos.

Na igreja de S. Pedro, passamos a distancia de um braço do cadáver do papa João XXIII (Ângelo Roncalli, no nosso entender, em todos os tempos, o homem mais notável da Sancta Mater Eclesia).

Paramos embevecidos diante da Pietá de Michelangelo e de tantas outras obras que fazem daquela igreja, museu e galeria de arte ao mesmo tempo.

Não vimos Moisés, porque o local em que ele se encontra está fechado para manutenção. É notável o cuidado que o europeu tem para com o seu patrimônio cultural.

Paris nos recebeu com o dia nublado. Fizemos o “city tour” pelos cartões postais.

Paris é o templo da aparência, onde a realidade está divorciada do glamour que se “vende” para o resto do mundo. Como no Rio de Janeiro, não é de bom tom dizer-se que não gostou disso ou daquilo. Há que se ter na ponta da língua o chavão “Paris é linda” da mesma forma que “O Rio é uma cidade maravilhosa”. Trata-se de paradigmas imutáveis por maiores que sejam as evidências em contrário.

Torre Eiffel, Tolherias, Arco do Triunfo, Inválidos (túmulo de Napoleão), Notre Dame, Champs Elisèe, Louvre (com direito à fotografia diante da Mona Lisa), passeio pelo Sena no Bateau Mouche e cemitério Pere Lachaise, onde foram sepultadas celebridades como Edith Piaf, Balzac, George Bizet, Champollion, Chopin, Alan Kardec, Augusto Comte, Moliere, Maria Callas e muitos outros.

Nosso hotel deve ter convênio com a empresa aérea japonesa porque, de cada dez hóspedes pelo menos oito eram nipônicos. Numa manhã, durante o desjejum, tivemos a oportunidade de assistir uma cena insólita.

O restaurante do hotel estava praticamente lotado. Um senhor idoso entrou e ficou parado quase no meio do salão. Todos os presentes levantaram-se e virados para ele, fizeram reverência para aquele homem vestido de negro com um sorriso de manequim pregado no rosto sereno.

Em silêncio, todos voltaram ao desjejum e o idoso sentou num local indicado pela jovem que lhe serviu a refeição. Nenhuma palavra, nenhum som antes, durante ou depois da cena curiosa.

Visitar Portugal é como ir à casa de um parente que não vemos a muito tempo. É um déjà-vu que dura todo tempo.

Visitamos Cascais, Cintra, Estoril, Jerônimos, Torre do Tombo, Monumento aos Descobridores, Nazaré, Cabo da Roca, Quinta da Regaleira, Batalha, Óbidos, Fátima... Em Lisboa, a Mouraria, o Bairro Alto, Rossio, Chiado...

Assistimos ao espetáculo de fados numa legítima taverna, comemos bacalhau, pasteis de Santa Clara, carapauzinhos ao molho escabeche, tomamos Ginjinha (licor de cereja fortíssimo produzido em Óbidos) e vimos o Tejo.

Para variar de tantas igrejas e museus, fomos ao zoológico, que é um exemplo de organização e de atitudes que procuram minimizar os efeitos do cativeiro nos animais não humanos.

Findos os treze dias, chegou a hora de voltar...