O Boêmio Porre.

Dias atrás, mais precisamente em uma ensolarada manhã de Sábado, estava em minha residência sem nada fazer. Pensamentos vão, pensamentos vêm, e para livrar-me do ócio e de elaborar mirabolantes idéias, resolvi andar em vão e só pela cidade.

Aquele dia estava tão autista, tão freneticamente depressivo, que acabei resolvendo embriagar-me com a grande dor gerada pelo ácido lático em meu organismo. Resolvi alcoolizar-me de exercícios físicos e apenas andar, andar e andar pela hipotética metrópole em que resido. Sem rumo, sem destino. Apenas perambular, como um louco ébrio medieval.

Desprovi-me de minha ânsia tecnológica e abandonei meu celular em cima de meu criado mudo, sai de minha casa munido apenas de um controle do portão eletrônico e cinco reais em diversas notas para caso precisasse chamar um moto-táxi.

Quando dei meus primeiros passos fiquei realmente confuso, não sabia qual rota traçar, qual destino me embasar, qual norte seguir, mas ratifiquei meu antigo pensamento, e decidi de uma vez por todas saborear os asfaltos de minha localidade natal.

Posteriormente a uns 20 minutos de (digamos) passeio, eu já estava defronte a uma extensa rua domada pelo comércio e adorada pelos economistas locais. Deparei com inúmeras pessoas e vários e vários pensamentos tomaram meu âmbito. Visualizei diversas situações, mas um fato em especial chamou minha atenção.

Vindo a meu encontro, avistei um casal de velhinhos, ambos muito debilitados, ela mal conseguia andar e ele estava visivelmente com seu intelecto abalado, todavia, literalmente um cuidava das necessidades do outro. A senhora era o cérebro do velhinho e o senhor era o andar da velhinha.

Quando o idoso casal passou por mim não me contive. Imediatamente faltou-me algo e sai em disparada, alimentando gradativamente meu grau etílico com meu próprio suor e com meu pensamento retido apenas nos céus.

Continuei minha caminhada, com minha mente restritamente elevada ao infinito boreal, e saudando dois de meus três grandes heróis - meu eterno avô e meu Pai astral.

Sem mesmo perceber, andei por inúmeros logradouros, por distintos bairros e espantei-me ao perceber onde estava. Já havia chego à atual casa de meu falecido herói mortal, já havia chego ao cemitério da cidade.

No local, sem muito pedir licença, e sem nem mesmo levar um presente se quer, já fui adentrando. Andei por algumas ruas, vi poucas pessoas vivas, e visualizei inúmeros túmulos antes de chegar ao do meu avô. Ao longe, avistei que havia uma pessoa colocando flores em seu túmulo, mas intrigado continuei meu deslocamento, porém logo avistei que era minha viva avó, cuidando do atual cômodo de seu marido. Preferi parar por ali e retomar minha caminhada, mas aquela cena a mim não era estranha, parecia-me insistentemente em minha mente um Deja Vu.

Continuei caminhando, cantando e seguindo a canção, mas não deixava de pensar nas duas inusitadas cenas que já havia me deparado. Sem preguiça e almejando também perder alguns quilinhos, continuei minha purificação astral.

Até aquele instante, já havia andando no mínimo um quarto de uma maratona e a sede já não se continha em mim, nem mais minha alcunha de alcoólatra, sustentava este desejo de ao menos meio litro de água. Lembrei-me de meus cinco reais, e como ainda tinha fôlego para meu caminho de volta, resolvi em um singelo bar realizar uma breve parada.

Bem no meio de minha eximia degustação - tomando uma saborosa água engarrafada, percebi que um senhor (que mal conseguia se sustensar sentado em cima daquele reles banquinho feito de madeira) saboreava também, algo parecido com a água que eu bebia.

O debilitado ser humano, após ingerir diversas doses daquela semelhante H2O, não conseguia nem mesmo falar. Lutou, relutou e com inúmeras dificuldades, conseguiu pagar aquela mínima conta e saiu da campestre sala em que estávamos.

Avistei que o homem morava ao lado do rústico estabelecimento comercial e que sua esposa chegara do serviço, simultaneamente àqueles fatos. A mulher avistou a debilitação aparente daquele homem, tomada pelo excesso do uso daquela que em meio aos presidiários é chamada de Maria louca, e popularmente conhecida como cachaça.

A mulher de Armindo, mesmo cansada e extremamente atarefada, não relutou em cuidar de seu amado, apenas colocou suas sacolas ao chão e o ajudou a entrar em seu imóvel, colocando-o para dormir. Realmente pasmei-me com a cena. Não conseguia crer que um amor tão tocante e tão complexo poderia existir em nosso mundo terreno.

Aquelas cenas que havia me deparado durante minha escalada findada ao meu ato boêmio, apenas me provaram que amores tão fortes e tão duradouros, como é o amor de nosso Deus por seus filhos, realmente existem.

Estes amores que presenciei naquela ensolarada manhã, são infindáveis sentimentos, que salvo engano, já perduram por 40, 50, ou até mesmo 60 anos e que mesmo após esta vida, eles continuaram a existir.

Eu ainda estava longe de casa, e precisava retomar minha sede pelo mesmo alcoolismo em que havia acordado, e refazer meu percurso. Fui andando e meditando como o amor realmente pode salvar o mundo. Se cada ser humano fosse capaz de sentir nem mesmo um por cento deste maravilhoso sentimento pelo próximo, o mundo realmente estaria provido de mais felicidade, de mais paz e desta maneira voltado ao sucesso. Mas infelizmente, hoje são poucas as pessoas que sabem o que é o amor e que sentem este magnânimo sentimento.

Fui com meus pensamentos atrelados a todas estas fantásticas experiências que, de certa forma, havia vivido e rapidamente já havia chego em minha residência. Logo que adentrei a mesma, tirei minha camiseta, toda demonstrada por aquela sede boêmia em que eu estava, e entrei ao quarto de meu terceiro herói.

Abracei-o, beijei-o, lhe desejei um ótimo dia e realmente constatei que todo aquele tocante sentimento magnífico e belo que me deparei em minha meia maratona matutina daquele final de semana, eu também possuía em meu ser. Não ainda por uma mulher, nem por qualquer terceiro que fosse, mas sim pelo meu pai.

Ame. Sinta. Raciocine o amor, sinta este singular sentimento. Declare seus desejos de querer bem ao mundo todo. Não seja avarento. Seja amoroso e faça o bem, sem ver a quem. Não pense no mal. Não diga que seu dia foi péssimo, diga que aquele dia não foi tão bom quanto os outros. Não diga que você tem um problema, diga aos seus problemas que você tem um Deus maior. Sinta a positividade das pequenas coisas que a vida lhe oferece. Viva. Agradeça. Apenas seja feliz!

Gabriel Gianinni
Enviado por Gabriel Gianinni em 18/05/2011
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