A Fantástica Merenda dos Inocentes

      Neste Brasil de Josué de Castro, a merenda escolar existe para que as crianças aprendam, sem o incômodo do estômago vazio, usufruindo da escola como um lugar prazeroso, confortável, atrativo e querido. Contudo, nunca aprendam o que os adultos fazem dessa merenda, contrariando suas finalidades. Neste sentido, apenas o Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE, por sugestão da CNBB, saiu da sua normal atuação para socorrer crianças em circunstâncias de calamidade pública, mesmo já alimentando trinta milhões de alunos do Ensino Fundamental, igual à população da Argentina.   
      No início do Governo Itamar Franco, fui indicado para ser Superintendente da Fundação de Assistência ao Estudante pelo exemplar paraibano Iveraldo Lucena, então Presidente da FAE, no tempo áureo desta Fundação, ao seu amigo Ministro Murílio Hingel.  Em Brasília, trabalhei dois anos e meio, adquirindo proveitosa experiência como um dos dirigentes do MEC. 
      Registro, desse tempo, a sã vaidade de ter alertado da inexistência do Programa de Transporte Escolar, apesar de então constar na Constituição como um dos programas complementares à educação.  De pronto, o Presidente Iveraldo aprovou a ideia; o Ministro Hingel, a implantação; e elaboramos, com ajuda do Prof. Severino Elias, o Projeto para ser encaminhado à Câmara de Deputados.  Foi assim que nasceu e cresceu o exitoso PNTE.  Hoje, em muitos municípios, trocam-se os então confortáveis ônibus doados pela FAE/MEC por caçambas ou caminhões terceirizados, tipo pau-de-arara. Isto não ocorria, quando havia as Representações da FAE em cada Estado, fiscalizando “in loco” e, com rigor, fazendo cumprir seus Programas. 
      A Merenda Escolar foi beneficiada também por aquela operosa gestão. Imaginem que o fubá do cuscus, em escolas paraibanas ao lado dos moinhos de milho, era comprado no Paraná ou em Minas, armazenado em São Paulo e trazido ao Nordeste, como se fazia com o sal, do Rio para as escolas de Mossoró ...  Os estudantes do Norte, região de rios e peixes, alimentavam-se com enlatados alienígenas, gaúchos ou paulistas.  Foi então que se determinou indispensável a descentralização: distribuir as atividades do centro à periferia do círculo ou  responsabilizar estados e municípios, sob a vigilância da FAE através das REFAE, da DEMEC , do Ministério Público, dos Tribunais de Conta, dos deputados, dos vereadores e dos cidadãos,  pela honesta aplicação dos recursos para uma merenda escolar de boa qualidade.  O Governo seguinte, numa medida inconsequente, destruiu a FAE, as REFAE e a DEMEC, restando ao FNDE, sem quadro suficiente,  o acúmulo dessas enormes tarefas.  
     
Estes esclarecimentos não criticam apenas eventuais desvios de recursos à escola. Mas, sobretudo, defendem a preservação da descentralização da merenda escolar, o que neutraliza interesses “centralizados”, promove oxigenação da economia local e leva à criança comida como a de casa, da lavoura e da cozinha da sua cultura, o que também ensina educação alimentar.