O CAMINHO DAS PEDRAS
Acordo cedo hoje. Os doces sonhos da noite diamantinense me revigoram a alma e me deixam com uma esperança renovada. Não sei por que, mas sinto-me revigorado como este sol que clareia mesmo por detrás das nuvens. No horizonte das Minas Gerais daqui, emergem juntamente com o sol, as formações rochosas em meio ao cerrado. Todas apontando na mesma direção, como se estivessem me mostrando o caminho.
- É para lá. Um pouco a sua direita. Para o alto. - Ansiosas para que eu me decida.
O sol ajuda amparado pela calma da ansiã sabedoria. Um gavião plana suavemente abaixo da varanda do hotel. Enquanto a brisa para mim é suave, ele próprio faz a velocidade do vento que bem lhe apraz.
Volto-me a mesinha da varanda quando começa a chuviscar. Numa pilha de baralho a minha frente, viro a primeira carta. Um ás de copas. Não sou supersticioso, mas adoro jogos. São desafios deliciosos.
“A”, a primeira letra. A primeira carta. Carta transporta mensagens. Copas, coração, emoção.
Recordo-me agora do livro criado por Markus Zusak, “I am the Messenger”, onde o protagonista, sendo um “zero” a esquerda, como ele mesmo se caracteriza, torna-se determinado a fazer o que é preciso.
Olho novamente a paisagem, novamente me levanto. Abaixo dos morros que insistem em me indicar um caminho, está a cidade palco de lindas histórias. Ilustres mineiros que escreveram páginas memoráveis no livro da vida. Chica da Silva, Juscelino Kubitschek, para não citar todos. Guerreiros que deixaram o exemplo de perseverança na busca do que acreditam.
Será que eles ouviram estas montanhas? Será que trecho da minha história ainda falta escrever? Agora me dou conta de que todos somos escritores. Se não escrevemos em papel, escrevemos pelos exemplos de vida. Só não escreve quem não vive. Só não lê quem não tem olhos de ler. Arrisco-me a dizer que não saber ler a letra viva da existência é pior que não saber ler no sentido literal.
Volto para o ás de copas. Uma letra, três corações. Na mesa, papel e lápis. Na cadeira a vontade de se fazer lido. Vou seguir as pedras. Para o alto, um pouco para lá.