APOSENTANDO-SE

Meu amigo.

Entras, agora, num período com o qual, certamente, sonhas há muito tempo. Afinal de contas, após três décadas trabalhando para a sociedade, alcanças a tão sonhada aposentadoria. Desejo-te felicidades nos dias que começam a compor, hoje, o resto da tua vida.

Quando aconteceu comigo, fui convidado a participar de um programa na Base Aérea de Florianópolis, o da "Preparação para a Reserva (Aposentadoria - no meio civil)". Bastante interessante, o programa abordava diversas áreas como, por exemplo, saúde, espiritualidade, estabelecimento de novas atividades - para sabermos o que fazer com o tempo de sobra que vamos ter, e por aí vai.

Como a Psicóloga encarregada do programa era minha amiga, em uma conversa anterior ao início do mesmo, ela me indagou como é que eu estava vendo a nova etapa da vida. Depois do papo, a mesma convidou-me para que, durante aquela semana, eu falasse sobre minhas experiências e expectativas acerca do que seria minha vida dali para a frente. Resumo o que falei aos ouvintes:

Um belo dia seu velho corpo (nem tão velho assim - somos apenas impiedosos com os aposentados) acostumado que está com a rotina de três décadas ou mais, desperta no mesmo horário que sempre despertou. Mas, antes de ir tratar da sua higiene matinal, você descobre que não precisa mais ir trabalhar - está livre disso. Vira sua barriga para o teto, coloca as mãos sob a cabeça, estica-se todo e dá aquela espreguiçada. Você é um ser realizado. Fica mais um tempo na cama, sua mulher (ou marido, conforme o caso) lhe dá um sorriso e tomam juntos o café da manhã, falando de futilidades. Os próximos dias seguirão essa rotina do "dolce far niente".

Num dia qualquer, seu cônjuge interrompe o papo durante o café dizendo que precisa fazer algo, tratar de alguma coisa (o que sempre fez enquanto você saía para o seu trabalho). Mais dia, menos dia, essas conversas deixarão de existir. Nessa hora, você descobre que está ocupando, dentro da sua própria casa, um lugar que não é seu. Afinal de contas, nos muitos anos que antecederam a sua aposentadoria, você não estava em casa naqueles horários (desde quando saía para o trabalho até o final da tarde, quando voltava do mesmo. Passa a ser um "corpo estranho" no seu próprio lar!!!

Essa nova fase de vida, se não for bem administrada, pode representar o início de problemas. A sua casa funcionou, sempre, de uma maneira que independia da sua presença. Você começa a ver coisas que podem ser novidades completas. Afinal de contas, você não estava ali para ver como elas aconteciam. Atrevendo-me a falar das coisas como elas são no nosso mundo machista, as mulheres têm mais jeito para administrar o lar. Elas constroem um quadro cronológico de atividades baseado na sua adaptabilidade e apenas nela. Aquilo que fez durante anos tem que continuar sendo feito. Levanta-se, vai ao banheiro, faz o café, liga a máquina de lavar roupas, começa a fazer o almoço, arruma os quartos, ajeita os filhos, alimenta os animais, varre o quintal, tira as roupas da máquina a as estende no varal, volta para ver o andamento do preparo da comida, telefona para uma amiga, marca a hora no salão de beleza, trata da faxina da casa e por aí vai. Tudo isso com a TV ligada. Você, é claro, não concorda com a "falta de método", com a dispersão de atividades.

Até que, um belo dia, você resolve querer ajudar. Pronto! Começam aí as divergências. Dessa fase para as briguinhas é um pulo. Você está se metendo numa seara que não conhece. Aconselho-o a "não se meter"...

Essa, sem dúvidas, é a hora na qual temos que nos cercar de cuidados para que não aconteçam "brigas" sérias. Pode ser que divergências aí surgidas descambem para um problema maior.

Temos visto, no nosso micro-universo etário, inúmeros casos de separação de casais que, até então, não tinham problemas. A nova realidade deve ser bem vivida, bem trabalhada. As pessoas devem estar conscientes de que estão vivendo uma nova vida, um novo tempo.

Afinal de contas, foram tão bons os anos vividos até agora, o caminho trilhado juntos. Para que estragar o que vinha dando certo?

Uma das soluções possíveis é o desempenho de uma atividade em horários semelhantes ao que você estava ausente de casa, no trabalho. Essa atividade não precisa ser, necessariamente, um emprego. Arranje um hobby, caminhe pelas ruas do seu barirro, converse com pessoas que estejam na mesma "mordomia" que você está, aposentadas. Entregue-se a uma atividade beneficente, ajude pessoas. O "curto-circuito" que pode aparecer com a sua "incômoda" presença dentro de casa, atrapalhando as atividades do seu lar, pode e tem que ser evitado.

Afinal de contas, vocês chegaram juntos até aqui. Continuem assim.

Nisso reside a FELICIDADE.

É lógico que falei para um público específico, o do meu nicho social. As vidas de todos ali eram muito parecidas. Mas, excetuando-se algumas particularidades, no geral é assim que acontece.

Não posso aconselhar a ninguém como proceder, mas não custa nada a gente ficar sabendo de coisas que acontecem nessa fase da vida. Até para não sermos apanhados de surpresa com o que pode vir a suceder.

Muita calma nessa hora!!!!!!!!!!!!!!

Afinal, calma é que não deve faltar a um aposentado de respeito.

Abraços.

PETROCCHI
Enviado por PETROCCHI em 10/05/2011
Reeditado em 10/05/2011
Código do texto: T2960531