O PEQUENO PRÍNCIPE E EU

Um livro só é verdadeiramente bom quando lido no tempo certo.

Certo dia, nos bons tempos de minha infância que já vai longe, um vizinho chamado Fernando, contou-me em poucas palavras a história de um garoto que viajava pelo espaço em busca de respostas a fim de um problema em seu planeta.

No resumo empolgado do meu amigo, eu achava graça e ao mesmo tempo ficava desconfiado, porque o garoto do livro falava não só com as pessoas, mas também com os animais.

Já havia escutado muitas estórias que minha avó contava enquanto me fazia dormir. Sabia que muitas eram inventadas por ela, mas se a do Fernando estava escrita num livro, era coisa diferente.

- É um livro de adulto! Dizia ele. Não é como os outros livros cheios de desenhos coloridos que as professoras liam pra nos enrolar e nos manter quietos durante o tempo que passávamos na escolinha.

- Desconfio que o Fernando esteja me achando com cara de besta. Onde já se viu alguém falar com bichos, ainda mais num livro de gente grande? Só na cabeça dele! Pensei com meus botões.

Pra mim aquilo era estória pra boi dormir, e como me julgava esperto, decidi não tomar o tal livro emprestado, como já havia feito em outras ocasiões.

Se o que fiz foi certo, não sei. O que realmente sei é que o mais errado de tudo foi termos crescido.

Mudamos de cidade, de Estado e acabamos perdendo o contato não só o nosso como de todos os amigos de infância.

A vida nos endurece a alma e os amores o coração. A incansável luta pela sobrevivência nos torna muitas vezes em desertos sem oasis. Assim vamos percorrendo a linha do tempo tropeçando aqui e ali em pequenos e raros momentos de felicidades. Quando menos esperamos já estamos nos aproximando do fim e percebemos que deixamos de realizar tantas coisas simples que poderiam ter mudado pra melhor a vida de outras pessoas.

As vésperas de meu ultimo aniversário, me aproximando dos cinqüenta, uma grande amiga me presenteou com um livro.

Na contracapa ela escreveu como dedicatória: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.” Achei aquela frase o máximo, e assim que cheguei em casa fui direto pro meu quarto e me pus a ler o tal livro.

Ele contava a história de um pequeno príncipe apaixonado por uma rosa que havia nascido em seu planeta. Antes dela aparecer, só havia neste lugar três vulcões - um deles extinto- e alguns arbustos que teimavam em crescer constantemente. Não sabendo como lhe dar com a rosa, que era cheia de mimos, ele resolve partir em busca de conhecimentos.

Andou por vários planetas, mas não encontrou ninguém que lhe acrescentasse nada de novo ao que ele já entendia sobre ela.

Por indicação de um geólogo, habitante de um dos planetas que visitou, ele veio parar na terra em busca dessas respostas.

Ao chegar, o primeiro ser vivo que encontrou foi uma serpente. Conversaram um pouco, sobre quem poderia dar as respostas certas que tanto buscava.

- Os homens são os mais indicados, pois eles cultivam rosas, e devem saber tudo sobre elas, disse a cobra.

- Onde eu os encontro, perguntou o garoto?

- Aqui não é o melhor lugar para encontrá-los, respondeu o animal. Estamos em pleno deserto e homes neste ambiente raramente eles são vistos. Se quiseres conhecê-los terás que procurar muito mais alémdessas montanhas. Ele então pois-se a caminhar até chegar a um enorme jardim repleto de flores.

- O que são vocês, perguntou ele?

- Somos rosas, responderam-lhe todas.

Naquele momento ele entristeceu-se e começou a chorar. Em seu coração ele havia sido traído, pois a rosa que nascera em seu planeta, tinha lhe enganado quando afirmou ser a única de sua espécie em todo o universo, e ele estava ali cercado por milhares de rosas todas iguais a ela.

Disfarçadamente pra que elas não vissem, ele enxugou as lágrimas e seguiu em frente.

Logo adiante apareceu em seu caminho uma raposa muito esperta. Esta tratou logo de consolá-lo explicando que mesmo existindo milhares de rosas iguais, só uma, justamente aquela nascida em seu planeta, seria especial e única pra ele.

A raposa não era um animal qualquer. Com certeza era a mais espertas de todas de sua espécie. Nenhum outro ser vivo havia lhe dito algo tão interessante e concreto a respeito das rosas, e isto tornava aquele bicho muito interessante.

Após contar-lhe várias coisas sobre sua vida de raposa, ela o pediu pra ser cativada por ele.

- Como faço isto? Perguntou ele.

- É simples, respondeu ela. Primeiro tu me olhas, depois vais se aproximando de mim cada dia mais, até tocar no meu pêlo. No momento em que eu sentir tua falta é o sinal de que me cativastes.

Ele então o fez e se tornaram grandes amigos. Foi justamente neste momento que ela lhe disse uma das frases mais lindas do livro: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Como o menino tinha que partir, os dois se despediram e o animalzinho voltou a a filosofar dizendo outra frase mais interessante ainda: “Muitas coisas que pra mim não tinha importância alguma, agora terão, pois me farão lembrar de ti.” Quando eu olhava um campo de trigo apenas via trigo, agora vou lembrar de teus cabelos dourados e isto me fará lembra de você.

Essas duas frases faziam alusão a amizade e ao amor que as pessoas sentem umas pelas outras e devem cultivar para sempre.

O garoto seguiu então sua jornada e encontrou pela frente um homem que havia caído com seu avião em pleno deserto do Saara. Durante o tempo em que ficaram juntos, enquanto o piloto consertava a aeronave, o menino lhe contou todas estas aventuras. Aos poucos o piloto foi percebendo que o garotinho não era uma miragem como ele havia imaginado ao vê-lo surgido do nada no meio do deserto.

Com a convivência, não sei dizer exatamente quem aprendeu mais um com o outro, se o garoto ou o homem. O fato é que depois de dias juntos no meio do nada, o avião foi concertado e o piloto precisava partir.

Ao perceber o sumiço do menino ele sai desesperado em sua procura e o encontra desfalecido. Tenta desesperadamente reanimá-lo, mas foi em vão. Neste momento ele percebeu que aquela pequena criatura tinha tomado o rumo de volta a seu planeta como havia lhe dito algumas vezes entre uma conversa e outra.

Sentiu-se triste, mas sabia que ele havia retornado pra casa com as respostas certas a cerca de como cultivar e manter vivo o seu grande amor, (a rosa).

O piloto voltou pra casa, impressionado com as coisas que o garoto tinha lhe dito. Todas as noites ao contemplar o céu, ele ouvia as estrelas lhe sorrindo. Era como se o pequeno principezinho estivesse brincando com elas.

Anos depois, recordando esses fatos, o homem resolve escrever um livro que se tornaria um dos mais lidos de todos os tempos: “O pequeno príncipe”.

Após a leitura conclui que se eu o tivesse lido quando ainda era uma criança, jamais entenderia a mensagem que o autor quis passar. Ficaria sem saber se ele tinha sido escrito para crianças ou pra adultos, como na verdade ele o é.

O mais óbvio em tudo isto foi que me lembrei imediatamente da história que meu amigo Fernando havia me contado quando ainda éramos crianças, a de um garoto que falava com os bichos e naquela época, não quis acreditar. Recordei também de Tereza, de Beto, de Toninho, e de tantos outros amigos de infância que o tempo havia se encarregado de apagar da minha memória. Queira Deus que todos estejam bem.

Obrigado Antoine de Saint-Exupéry pela viagem ao passado que me proporcionaste durante a leitura de sua obra prima “O pequeno príncipe”.

Herivaldo Ataíde
Enviado por Herivaldo Ataíde em 09/05/2011
Reeditado em 19/03/2024
Código do texto: T2958104
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