Não Me Importo!

Olá! Meu nome é Ayalla Tupi, tenho sessenta e sete anos, mas nem parece... parece uns oitenta.... Hi, hi, hi, hi. É brincadeira. Dizem que tenho menos, mesmo. É que sempre que alguém insinua que um outro, ou algo, parece ter menos idade do que, realmente aparenta ter, lembro-me de meu saudoso pai. Ele sempre fazia esta piada para mim. Geralmente, sem a pessoa perceber... "Tem trinta anos...? Sabe que não parece...". E cochichava em meu ouvido: "Parece que tem cinquenta...". Ah... lembro-me que padecia de exultação quando isto acontecia.

Já estou aposentada. Mas voltei a trabalhar dando aulas para fisioterapeutas que querem atuar na Unidade de Tratamento Intensivo, de hospitais e clínicas.

Quando jovenzinha, na escola, após o professor falar meu nome completo, a turma, praticamente toda, entoava um sonoro "NAMBÁ" antes mesmo de conseguir falar "presente". Se fosse nos tempos atuais, poderia chamar de bulling, mas só pelo "modismo", pois sentia-me querida por todos os meus amiguinhos da escola...

Fiquei mais madura e queria me sentir "descolada". Era brincalhona e falava pelos cotovelos. Não deixava ninguém sentindo mágoas ou descontentamentos, perto de mim. Queria um mundo totalmente azul. Vivia fantasiando a realidade.

Foi quando conheci aquele que viria a ser meu esposo. Com sua postura, aconteceu aquilo que chamo de choque de realidade. Ele nunca respondia mal a seus pais e era muito atencioso com os mais velhos. Daí que percebi que precisava melhorar o meu sentimento mais íntimo. Começou, então, a fazer sentido o que meu pai dizia: "Não basta ser honesto. É preciso parecer honesto".

Me vi, diante desta frase, uma perfeita intérprete do mundo. Pois, depois de entender que se tem que parecer com o que você quer ser, minha imaginação flutuava.... Fosse um casal se beijando repetidas vezes antes do metrô parar na estação e um deles ter que descer, logo imaginava a frase: "Adoraria continuar neste viagem". Se uma enfermeira abre uma ampola de injeção na frente da criança, com o choro dela, olhando para os pais, me vem na cabeça: "Se vocês me amam, por que estão fazendo isso comigo?".

Outro dia fiz uma coletânea...

As personagens: Motoristas de coletivo urbano rodoviário.

Situação: Dirigindo ônibus.

Pensamento: Eu não me importo!

É claro, não foram todos os motoristas que encontrei na rua. Mas, o curioso, é que, não precisava ser muito criativa para que esta frase viesse a saltar em minha mente.... Crianças no ponto de ônibus, uniformizadas, prontas para irem para a escola e o ônibus não parava...era olhar para o motorista e subjugar: "Não me importo". Idosos debaixo de sol, faziam sinal para o ônibus parar e logo se fazia sumindo na curva. Mais uma vez: "Não me importo"...

Sou simpatizante de duas ONG's. Uma sobre reciclagem e a outra defende o uso de transportes alternativos.

Sim, tenho carro. Mas sou a típica motorista de final de semana. Uso o carro para ir à igreja, aos domingos e para visitar amigos e parentes quando quero levar duas de minhas sobrinhas, a Lia e a Flora. Pois, adoro a companhia delas, mas são muito preguiçosas.

Na igreja, é, basicamente, para dar carona para as aquiescentes senhoras que, eventualmente, precisam desse tipo de ajuda.

Certa vez, conversando com especialistas, recebi uma informação muito aprazíver e conveniente: "Temos algum grau de responsabilidade em cima do que não gostamos, no outro".

E isto me fez pensar muito. Mais uma vez pensei nos motoristas, irresponsáveis, de ônibus. E queria descobrir o que me identificava com a minha evidência. E com singelo embaraço, diluiu-se a procura, ao afirmar: "Não me importo" de ter perdido algumas festas, na vida. "Não me importo" em querer aperfeiçoar-me para atender a necessitados. E "não me importo" de, a cada dia, ser mais feliz.

Glauco Sessa
Enviado por Glauco Sessa em 08/05/2011
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