Menino de Realengo não era Menino do Rio

Menino de realengo não era menino do Rio

“Menino do Rio, calor que provoca arrepio,’ é o primeiro verso da tão famosa letra composta por nosso poeta mor, Caetano Veloso, e lançada nos idos anos 80 por Baby Consuelo. A letra desta música pôde ser fio temático, relançada na novela, intitulada Três Irmãs ,exibida no horário das 19h00 na TV Globo,no ano de 2009.

A intertextualidade encontrada nesta composição musical traça um ponto de intersecção entre o menino do Rio da melodia e da imagem televisiva, menino lírico e menino midiático, real e virtual.

Contudo , o que se faz hoje presente no imaginário das pessoas , não é a trama da Globo, mas o drama sofrido por vítimas do menino que era do Realengo ,quando surfou as marés da morte e se tornou menino da notícia de jornal: bicho causador de um terror inevitável, apresentado no palco da narração de sangue a escorrer pela boca do jornalista ...Sendo isso o “punctum saliens”.

Da novela, extraímos da vida social uma outra coisa : que não só são as impressionantes cenas de ação e aventura apresentadas por alguns belos jovens atores ,que aparecem com pranchas debaixo dos braços , entrando no mar e desafiando imensas correntezas, que nos fazem sonhar com aquele menino cantado por Baby, com um dragão tatuado no braço , sinônimo de irreverência e mesmo de curtição , calção e corpo aberto no espaço, conotando liberdade.

Mas sim,o vigor dos corpos desses jovens bem aparelhados, bem retocados, bem abertos, ocupam um lugar na mídia e na admiração do público feminino brasileiro.A areia da praia, as ondas do mar revelam , o surf , a manobra da prancha denota o equilíbrio da mente, a fera mãe onda seguida pelo homem, mostra a superação das dificuldades.É preciso desenvolver um tipo de estratégia para não perder a cabeça.Pois pode-se encontrar elementos de obstáculos como troncos , pedaços de ferro e materiais que poderão provocar o desvio do curso das aventuras.

Destaca-se entretanto, na saliência da intersecção,o arrepio de sangue e o corpo sob a prancha da desgraça do menino de Realengo, de compleição física tísica,que não era “o menino do Rio”. Porque, enquanto o menino do Rio podia se deleitar integrando-se com a mãe natureza, o menino de Realengo arquitetava um plano sinistro que não atrairia o público brasileiro,deixando o IDH,quantificar o que há de mais baixo na natureza, excretar...

O menino de Realengo , ao invés de chamar a atenção de multidões,era órfão e vivia sozinho,ao invés de ser aclamado pela mídia, era distanciado até mesmo da família.Era hóspede da solidão e dos maus presságios.O ambiente de diversão do menino do Rio eram as marés altas e baixas da animação, mas o menino de Realengo, não se divertia, amargava numa casa inóspita sem luar, nem cores do mar. O treino do menino de Realengo era para uma guerra sem dimensões de vitória.

O material de brinquedo do menino do Rio era a prancha de madeira, enquanto o brinquedo que o menino de Realengo usava era de metal duro, bélico, cheio de munição como estava o próprio coração, munido de idéias de desmoronamento da esperança e de morte.

Não sei se o menino de Realengo pode compartilhar das culpas, pelas mortes que cometeu , com outras pessoas do Sistema, só sei que a sociedade pode criar outros meninos do Rio, surfistas, amantes de outras ondas que não são as que quedam no mar da criminalidade e da impunidade.

Há muitos meninos de Realengo que podem brotar de um modelo de sociedade onde a escola não seja levada pela ondulação do bullyng , do neo-liberalismo e casuísmo com as classes proletárias.Onde a negação da luta de classes não seja o grande pretexto para tal desfecho.

Cida Maia, madrugada do dia 3 de maio de 2011

Cida Maia
Enviado por Cida Maia em 05/05/2011
Reeditado em 27/05/2014
Código do texto: T2950126
Classificação de conteúdo: seguro