A Rua da Lapa
A Rua da Lapa é como um corredor humano. Um vai-e-vem. Ela começa ali na Igreja de Nossa Senhora da Lapa do Desterro e se extende até o início da Rua da Glória. Na Rua da Lapa há diversidades de seres humanos e de seres não humanos. Há seus prédios coloniais e seus prédios nem tão coloniais assim. Há marquises que resistem e outras que não resistem mais, e estas últimas quase matou uma velhinha, ali na esquina da Taylor Street.
Certo dia tinha um senhor magricela com um sotaque da Terra da Rainha Elizabeth, que fora inquirido sobre o nome daquela rua, por uma jovem paulistana. Da forma mais polida de um súdito vitoriano, discursou: "- This is the Taylor Street."
Do "Beco dos Ratos" a Taylor Street fica o mercado das pulgas. Monitores, mouses, teclados, cpu, livros, quadros, vasos, brinquedos, louças, roupas, sapatos, cd, vinil, vitrola, móveis, antiqualhas perfilam-se sobre a calçada sob os olhos capitalistas das gentes diversas que pisam aquela terra antiga.
A Rua da Lapa guarda lembranças longínquas e produz novas histórias. Conheço suas lembranças pelos livros, pelos olhos dos velhos que ainda resistem à existência e à geografia carioca, pelos sebos e seus livros sobre os jovens daquela época.
A Rua da Lapa guarda sua mística. Transfere esta mística para os sensíveis. Cada vez que a atravesso posso contemplar um senhor de fraque e cartola e um jovem boêmio errante. Estes costumes ficaram para aquele tempo, mas os senhores e os jovens continuam pisando sobre esta rua como a repetir religiosamente os passos do "Bruxo do Cosme Velho" e do jovem errante Olavo Bilac.
Hoje eu, minha esposa e minha filha passamos pela Rua da Lapa. Foi uma experiência transcendental.