A revolução pela arte

A galeria estava iluminada, os janelões decorados com cortinas de cetim e laços de fitas em magníficas sobreposições. O público passeava ao longo do imenso salão repleto de obras cuidadosamente selecionadas dos maiores pintores da história da arte, Monet, Degas, Van Gogh, Lautrec, Seurat, Dali e Magritte. Montes Claros era notícia em todo o Brasil pela ousadia em nome da arte que há muito tempo ficara subjugada por politiqueiros. Estrangeiros também comentavam e enviavam suas imprensas para cobrir a revolução dos Norte-Mineiros, que com um grupo de artistas aniquilaram o antigo regime apenas com o talento das suas composições, ressaltou um jornalista do New York Times. O Le Monde Jornal Francês que dedica grande parte do seu espaço para as coisas do Museu do Louvre, enviou seu maior critico de arte que após diversas pesquisas contou em detalhes como tudo começou, dizendo que em meados do mês de julho quando acontecia à exposição agropecuária de Montes Claros, que normalmente eram oito dias de festa com muitas atrações nos palcos do parque da Avenida Geraldo Athayde, para os artistas locais foi uma decepcionante surpresa a total ausência dos artistas da Princesinha do Norte (alcunha carinhosa do lugar) não tinha Pedro Boi nem Charles Boa Vista nem Carlos Maia, muito menos Marcos Paracatu com a voz de Bete, ou Juquita Queiroz, não chamaram R-18 que é sucesso no Caldeirão do Hulk (programa de auditório da televisão brasileira), nem se fala em Wagner Black com os Desperta Doidos que agora não toca mais de graça nem no aniversário da Kazza do Livro. Enfim ninguém que desenvolve atividade artística em Montes Claros fora lembrado. Mas o descaso não foi só musical, os poetas tiveram que assistir aos repentistas e versadores livres indicados por figurões de Brasília (capital do país), assim como os artistas plásticos que tiveram que engolir até Read Mades contemporâneos de alguns filhotes de Bienais segundo informaram em entrevistas, e até sentir o sôco no estômago das criticas vazias de capciosos indivíduos (ressaltou em tom de exaltação um escultor autodidata). Depois desta prova irrefutável de vilipêndio a arte da cidade, uma combinação extraordinária de forças de todos os talentos se fizeram em dado momento, os guitarristas e baixistas ligaram seus instrumentos em volta das serras que circulam a aldeia inflamada, subiram com baterias nos montes que são dinamitados covardemente e juntos começaram a tocar, os pintores com imensos andaimes subiram até as nuvens e começaram a pintar outro dia, imensuráveis afrescos eram coloridos com as caras que deviam ter um espaço de arte, Poetas e dançarinos se desnudavam nas ruas explicitando suas mais intimas emoções causando assim um enorme furor. De repente a realidade era a musica tocada em volta de quem nunca ouviu a canção do seu próprio povo, com repiques das baterias que quebravam em pratos de ataques exumando das crateras dinamitadas as pedras ancestrais que dormiam sob o pó do progresso, a insensibilidade dos homens que tinham a chave da cidade se fizeram em neoplasias malignas que começaram a devorar sem piedade seus interiores. Gritos ensurdecedores dos artistas em seus transes merecidos contrastavam com a nova cara que o dia deixara sobre as nuvens cianóticas, e o cheiro de novo se fez em toda a extensão do universo. A inspiração que não se acaba seguia produzindo nas cabeças dos artistas outros ritmos ainda mais corrosivos para aqueles seres que eram desgraçados pelo câncer das suas intransigências, e assim o espaço no céu foi pintado. As canções circulantes das montanhas e as retumbâncias percussivas diminuíram os ritmos e a poesia calou-se em um ato de descanso, toda nudez foi vestida já que os passos da dança fizeram intervalo. Foi assim que ao findar o show os cadáveres foram derretidos em seus bueiros e esquecidos pelas suas inadimplências com a arte da cidade que agora com o novo governo dos homens inspirados, dizem com orgulho que Montes Claros é agora a cidade da arte e da cultura. Na galeria os olhares bestificados paralisavam em frente à noite estrelada do mestre holandês e caminhavam regidos pela hipnose pontilhada de George Seurat o seguidor das teorias cromáticas de Helmholtz. Os apreciadores do Impressionismo faziam anotações dos emplastos do Lago das ninfeias de Claude Monet e fotografavam as bailarinas de Edgar Degas. Os seguranças com seus radiocomunicadores se colocavam em posição de vigia e trocavam de posições constantemente aos movimentos que evoluíam com a chegada de novas pessoas, porém apenas como breves rotinas... Pois após o obsoletismo ser consumido pelo seu próprio câncer o mínimo que pode acontecer é o povo acordar deste pesadelo...