Dos muitos desejos que tenho, agora quero ser árvore
Jogo-me do alto de um penhasco a fim de sofrer na impaciência do chacoalhar das árvores. Que só tem a si o sofrimento de acalmar o vento para não machucar seus galhos. E tem por única preocupação, lembrar a chuva para alimentá-la, banhá-la e satisfazê-la.
Além de lindas, o que já é em mim a inveja de sua beleza; também as invejo sua realeza de vagabundear. Perceba: ela apenas precisa ficar ali, dando. Ou melhor, doando sombra, frutos, e alento. Árvore não tem chefe chato, não tem livro de ponto, não é subordinada e não precisa subordinar ninguém. Seu único trabalho é vagabundear. É receber de braços abertos os sussurros obscenos do vento, o suor da chuva e os afagos dos raios de sol feito uma rainha.
É a única que pode bater os pés e dizer “daqui eu não saio, finco minhas raízes aqui e quero ver alguém me tirar”. Ela é soberana, teimosa, frondosa e cheia de si. Sabe de tudo e de todos, pois enxerga a vida de cima.
Ela pode ser considerada a mãe da natureza, porque recebe os choros da lua e não reclama nunca de ouvi-los, apenas a aconselha de acalmar-se quando está cheia, deixar de ser chata quando está nova, alimentar-se melhor quando está minguante. E ai se a lua não obedecer a mãe, é capaz de ficar de castigo em um quarto crescente.
E como toda boa mãe, também gosta de alimentar seus filhos dos mais diferentes frutos, come quem quer. E sempre tem quem queira. Mas ela não se chateia, filhos foram criados para serem malcriados, não é verdade?
Todos gostaríamos de ser árvores um dia. Fincar raízes, ter comida na boca, abraços de quem vem de longe. Saudade dos que vem de perto. E principalmente vagabundear. Não precisar pagar contas, nem ir trabalhar... viver de brisa literalmente. Sombra e água fresca.
Árvores também são felizes no aspecto amar. Não precisam se preocupar com quem namorar, se vão namorar. Não sofrem com a angústia do telefonema prometido, ou daquele vestido vinho que você foi na festa e não sabe se estava suficientemente sexy.
Árvores não precisam se produzir para um primeiro encontro, preocupar-se em usar as palavras certas na hora certa. Ter medo do primeiro beijo, ou simplesmente supor se o seu beijo foi tão bom daquele que a beijou. Muito menos ainda, árvores não se preocupam em agradar seu parceiro no primeiro aniversário de casamento. E ela é feliz porque nunca saberá se seu casamento continua agradando depois de quatorze anos de enlace. Os mesmos quatorze anos que perdeu a habilidade de dormir depois que seu filho nasceu e chorou durante quatro meses seguidos por causa de não sei o quê, e chorará sempre independente da idade dos seus filhos.
Árvore é feliz por não ser humana. De não ter de agradar sempre, se sorrir sempre, de fazer tudo certo, de não ser perfeita. Não ter a obrigação de humanizar.
A única obrigação é de ser.
S.P. 01/05/11 (22:47)
Jogo-me do alto de um penhasco a fim de sofrer na impaciência do chacoalhar das árvores. Que só tem a si o sofrimento de acalmar o vento para não machucar seus galhos. E tem por única preocupação, lembrar a chuva para alimentá-la, banhá-la e satisfazê-la.
Além de lindas, o que já é em mim a inveja de sua beleza; também as invejo sua realeza de vagabundear. Perceba: ela apenas precisa ficar ali, dando. Ou melhor, doando sombra, frutos, e alento. Árvore não tem chefe chato, não tem livro de ponto, não é subordinada e não precisa subordinar ninguém. Seu único trabalho é vagabundear. É receber de braços abertos os sussurros obscenos do vento, o suor da chuva e os afagos dos raios de sol feito uma rainha.
É a única que pode bater os pés e dizer “daqui eu não saio, finco minhas raízes aqui e quero ver alguém me tirar”. Ela é soberana, teimosa, frondosa e cheia de si. Sabe de tudo e de todos, pois enxerga a vida de cima.
Ela pode ser considerada a mãe da natureza, porque recebe os choros da lua e não reclama nunca de ouvi-los, apenas a aconselha de acalmar-se quando está cheia, deixar de ser chata quando está nova, alimentar-se melhor quando está minguante. E ai se a lua não obedecer a mãe, é capaz de ficar de castigo em um quarto crescente.
E como toda boa mãe, também gosta de alimentar seus filhos dos mais diferentes frutos, come quem quer. E sempre tem quem queira. Mas ela não se chateia, filhos foram criados para serem malcriados, não é verdade?
Todos gostaríamos de ser árvores um dia. Fincar raízes, ter comida na boca, abraços de quem vem de longe. Saudade dos que vem de perto. E principalmente vagabundear. Não precisar pagar contas, nem ir trabalhar... viver de brisa literalmente. Sombra e água fresca.
Árvores também são felizes no aspecto amar. Não precisam se preocupar com quem namorar, se vão namorar. Não sofrem com a angústia do telefonema prometido, ou daquele vestido vinho que você foi na festa e não sabe se estava suficientemente sexy.
Árvores não precisam se produzir para um primeiro encontro, preocupar-se em usar as palavras certas na hora certa. Ter medo do primeiro beijo, ou simplesmente supor se o seu beijo foi tão bom daquele que a beijou. Muito menos ainda, árvores não se preocupam em agradar seu parceiro no primeiro aniversário de casamento. E ela é feliz porque nunca saberá se seu casamento continua agradando depois de quatorze anos de enlace. Os mesmos quatorze anos que perdeu a habilidade de dormir depois que seu filho nasceu e chorou durante quatro meses seguidos por causa de não sei o quê, e chorará sempre independente da idade dos seus filhos.
Árvore é feliz por não ser humana. De não ter de agradar sempre, se sorrir sempre, de fazer tudo certo, de não ser perfeita. Não ter a obrigação de humanizar.
A única obrigação é de ser.
S.P. 01/05/11 (22:47)