Relâmpagos e trovões

     1. Esta semana fui acordado por uma escandalosa trovoada, e estranhei. Em novembro, não chove nem troveja em Salvador. É sol puro! 
     2
. Na Bahia, a trovoada pra valer é a do dia 4 de dezembro. É a tradicional trovoada de Santa Bárbara, para os católicos; Iansã, para o pessoal do candomblé.
     3. O dia de Santa Bárbara ou de Iansã, é, também, o dia dos bons carurus em Salvador. O
caruru, segundo os terreiros, é a comida preferida de Cosme e Damião, os santos gêmeos. Por causa do quiabo, detesto caruru. 
     4. Homenageio os santos médicos comendo vatapá e xinxim de galinha, quitutes que também fazem parte do respeitado "caruru de São Cosme", me garantem as queridas baianas do acarajé, quando visito seus tabuleiros, no largo de Amaralina. 
     5. Comecei dizendo, que, em plena madrugada, fora acordado por uma escandalosa trovoada. Lembro-me que saltei da minha rede pensando que estava em Bagdá. Quem me viu acordando, completamente atordoado, espalhou que eu gritava: - "È a guerra! É a guerra!  "Cadê Saddam? Cadê Saddam?"  Morreu? Mataram?
     6. Desperto, vi, da janela do meu quarto, no quinto andar do Edifício Jardim Paulista, que sobre meu bairro desabava um violento toró.
Chovia na Pituba!
     7.  Pouquinho antes da meia-noite, quando me preparava para dormir, vejam só, vasculhara o céu de Salvador e não vira, como dizia Rachel de Queiroz, "nuvens chuvedeiras".
     8. O Cruzeiro do Sul brilhava com raro esplendor. Até a "Intrometida", de presença muito discreta na constelação, mostrava-se mais enxerida do que nunca. 
     9. Seguindo um velho costume, fizera uma breve oração diante do Cruzeiro, encerrando mais um "cansativo" dia de aposentado. 
     10. O tempo mudara com a cheagada da madrugada e vieram os relâmpagos, os trovões, e um preocupante pé-d´água.
     11. Confessei n´alguma crônica, que morro de medo de relâmpago e de trovão. Mesmo tendo ouvido dos sapientes matutos do sertão do Ceará que "feliz de quem ouve o trovão". O perigo estaria, pois, no relâmpago.
     12. Meninote, li que o trovão era "obra do satanás". Dizia o conto de um tal Henri Pourrat, que o demônio, numa disputa com Javé, fizera o trovão, com o objetivo de mexer com os filhos do Criador, testando-lhes a Fé em Deus. 
     13. Mas Jeová - prosseguia Pourrat -, mais astuto do que o demo, dera o troco, criando o relâmpago. Apressando-se em avisar a satã, que assim agira, para que as criaturas, antes do estouro do trovão, a Ele recorressem...
     14. Se o relâmpago é uma invenção de Deus, por que temê-lo? Confesso, que ao longo dos anos venho me esforçando para vê-lo como um espetáculo promovido pelo Divino e estou quase conseguindo.
     15. Mas, no céu, no inferno, ou aonde eu chegar,  armarei o maior barraco se morrer fulminado por um raio maroto, em dia de tempestade. OK, Javé? 


 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 17/11/2006
Reeditado em 10/10/2017
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