TÁCITA PENA EM BRANCAS PÁGINAS
TÁCITA PENA EM BRANCAS PÁGINAS
Uma fétida espada transpassa meu ser, e o árido deserto se faz em minha alma.
Imerso nas coisas do mundo, já não vivo. Sou o retrato da multidão que não ama: um morto que caminha*.
A tácita pena jaz sobre a página em branco; enquanto no tinteiro a vida se cala, sem palavras.
O frágil corpo ainda resiste, mas a alma se queima: sou algoz de mim mesmo.
O último golpe! O corpo estremece, enquanto os joelhos se dobram. As forças se esvaem por entre as linhas da página em branco, que se impõe. E a pena, dá pena de se ver!
A luminária, no canto da escrivaninha pisca, como se em curto retratasse aquele momento: doa à vida seu último facho de luz.
Silêncio e penumbra.
Da alma proscrita, o último fôlego de vida se faz pensamento: “amarás teu Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”.
No silêncio, o pulsar do coração cansado se faz reticências...(...)...(...)...e da alma, a aridez se esvai.
Na penumbra, a vida retoma sua luz. O pensamento embotado rompe o deserto e proclama: “És Tu Senhor meu único bem!”
A mão trêmula retoma a pena, e do tinteiro pulsa a vida em doces palavras; enquanto a página em branco doa seus signos às almas que jorram por entre suas linhas.
(*Expressão utilizada por Igino Giornadi . Diário de fogo. Editora Cidade Nova. São Paulo, 1986).