Escrevendo Almodóvar no Bar
Já escrevi sobre quase tudo. Sobre política, mulheres, cigarros, cinzeiros, traições, futebol, medo, dor, machismo e feminismo. Já escrevi de Obama ao sujeito que pede dinheiro na esquina. De A à Z. De cabo à rabo. Não sei quem leu, se alguém leu, ou se alguém gostou. Escrevo e só.
Entretanto, estive ausente por algum tempo, não escrevi uma linha sequer. Não que tenha me faltado inspiração, muito menos faltou palavras no meu dicionário, é que fui buscar um pouco de fumo para o paeiro, ele não acendia mais. Não adiantava riscar o fósforo, faltava palha.
Fui no beco da Timbuca, dobrando a Duque, no Bar do Gastão, onde tem mesa de sinuca, cadeira de lata, cinzeiro, fumaça, cerveja, pagode e cartazes da brahma, da sol e skol na parede. Lá tem cheiro de gordura, risada e poesia. Lá o melindre é levado a sério. Lá tem paeiro, e do bom. Preciso confessar outra coisa: ainda estou sentado no bar do Gastão. Numa cadeira de lata amarela, bebendo pureza em copo pequeno. Não tive coragem de voltar. Não tive nem vontade de retornar ao perambulo dos bares que eu andava freqüentando, donde a cerveja é quente, o pastel é queimado e sempre faltava palha pro paeiro. Por lá, debaixo da meia água, me dispo e me refaço, me transbordo e volto a ser raso, vivo este eu.
Esperem, ainda voltarei a escrever, com lápis sem ponta, em papel amassado, uma novela de Almodóvar, em algum bar qualquer.