Íris

Ela é uma gata.

Com profundos olhos azuis, vive rebolando entre as bancadas e prateleira de um sebo que fica na Rua Buarque de Macedo.

Seu nome é Íris, uma homenagem a deusa grega que é mensageira dos deuses, em particular de Zeus e de Hera.

Hermes é seu correspondente masculino.

Íris simboliza o arco-íris e é tida como o elo entre o Céu e a Terra, entre as divindades e os homens, pobres mortais.

Quando a vi pela primeira vez, veio logo aquela idéia que diz que escritores têm os gatos como fetiche.

Íris com seus enormes olhos azuis, e o pelo cor de areia da praia de Copacabana, fazia de colchão para sua soneca da tarde quatro escritores que, particularmente, aprecio muito, são cânones portugueses: Manuel Bandeira (Estrela da vida), João Guimarães Rosa (Noites do sertão) e José Saramago (A jangada de pedra).

Se gato, ou no caso de Íris, gata, é fetiche de escritor, não sei. O que sei é que a felina do sebo tem muito bom gosto de fazer dos poemas de Bandeira um travesseiro, sonhando com a rica prosa de Saramago e de Rosa.

Escrevo, mas não tenho nenhum gato ou gata como fetiche. Na verdade, o meu animal é o cachorro, comprovando aquela tese do “melhor amigo do homem (no meu caso, mulher)”.

Gato mesmo só tive um e se chamava Cyrano, em homenagem ao personagem que adoro.

Meus animais são batizados invariavelmente como nomes de personagens literários preferidos e pessoas ligadas às artes.

Já tive Rei, em homenagem ao Rei Artur da Távora Redonda, também tive uma Brigite (atriz), e assim sempre foi a galeria dos meus amigos caninos. O mais recente chama-se Poeta.

Como não dava para chamá-lo de “Vininha-Chico-Tom-Pessoa”, resolvi batizá-lo com um nome que resumisse meus grandes amores: Poeta. Acho que ficou bom.

Poeta agora precisa de uma namorada, e estou pensando em procurar uma que tenha cara de Flor.

Sim, porque Poeta não pode viver separado de uma Moça e uma Flor, conforme já dizia aquela música de Vinícius de Morais.

É muito importante que o meu bicho tenha cara do nome que quero lhe dar.

Já conheci um buldogue chamado Apolônio, e sua digníssima esposa tinha a alcunha de Isabel . Um casal bárbaro! Pois eles tinham mesmo cara de Apolônio e Isabel, do mesmo jeito que Íris também tem cara de Íris.

Adoro nomes!

Nomes bonitos, exóticos, diferentes, engraçados.

Nomes e também sobrenomes. Por isso, escolho com todo o cuidado um que combine com o meu bichinho de estimação.

Aliás, não é só bicho que precisa de nome adequado.

Conheci um menino de cinco anos chamado Capristêneo. Claro que ele tinha um apelido: Tetê.

Não sei o que é pior, o nome ou o apelido. Imagine quando tiver maiorzinho o quanto sofrerá com as piadas, não só pelo nome próprio, mas também pelo apelido, pois normalmente é uma abreviatura feminina.

Coitado.

Os pais criaram um inimigo em casa.

Nota da autora: quando escrevi esta crônica não tinha nenhum gato. Hoje tenho. Chama-se Dom Casmurro e é um lindo felino da cor de chocolate amargo e que tem grandes olhos verdes. Tal qual o nome do personagem de Machado, o meu Casmurro também é rabugento, razinza. A-d-o-r-á-v-e-l!

Carla Giffoni
Enviado por Carla Giffoni em 23/04/2011
Código do texto: T2925373
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