A Parábola dos Dissipadores

Enquanto ela ali estava, sabia que vinha muita gente. Acostumada a preparar comida pra multidões preparou comida em abundância. Tudo do bom e do melhor. Não teria preocupação. Os tachos estavam cheios, as mesas postas. Uma tristeza teimosa queria mostrar a cara: ninguém dava valor ao que ela fazia, ninguém se oferecia para lhe amenizar as tarefas, ninguém lhe prestava atenção. Todos viam nela um estorvo, uma pedra, algo que precisava sair do caminho. Somente uma pessoa lhe dava atenção: um ancião. Sentado no seu canto, tudo via, tudo percebia, tudo entendia, porém em silencio permanecia.

Ela disfarçava, corria contra o tempo. Queria participar da festa. O carro iria chegar cheio de gente e somente ela sabia mostrar o caminho mais perto pra chegar ao local da festividade.

Enquanto se aprontava, percebeu que o carro chegou. Pediu que lhe esperassem, pois ela já estava quase pronta. Só faltava ajeitar os cabelos... Correu tanto, os grampos caíram ao chão. O perfume não achava... Tudo parecia conspirar contra ela.

Ao sair do quarto, percebeu que ninguém quis provar sua deliciosa comida. Pior: Tudo que estava nos tachos tinha tinham sido lançados ao chão. O carro havia partido. Ela engoliu as lágrimas, e disse:

- Por que vocês não pediram que me esperassem? Eu sabia mostrar o caminho mais perto!

Com o peito apertado, saiu correndo, lutando pra vencer o carro que se distanciava tanto. Pegou um ônibus errado, mas conseguiu chegar à mesma hora que o outro veículo chegara. A festa estava apenas começando. Ela nada perdeu, mas uma pergunta teimava em lhe inquietar:

- Por que ninguém quis provar da minha comida? Por que jogaram fora o que eu havia preparado com tanto amor e carinho? Por quê?

Voltando pra casa, viu que ninguém se dera ao cuidado de limpar o que propositadamente fora desperdiçado. Dirigiu-se ao ancião e antes de perguntar, pode ouvir as respostas que seu coração há muito tempo fazia.

- É tempo de você partir. Você tentou alimentá-los, preparou a melhor comida, quis mostrar o caminho, mas ninguém lhe deu ouvido, ninguém percebeu que o que estava ao alcance tinha valor. Vá. Mas não pense que o caminho vai ser fácil. Muitos darão valor, aproveitarão as dádivas que sairão do seu coração. Outros, e serão maioria, não entenderão, escarnecerão, verão em você um ser alienado, um ser pra ser eliminado. Uma pedra. Um lixo. Um incômodo.

A moça saiu dali chorando. Partiu porque a hora tinha chegado, mas o recado tinha recebido. O ancião tinha razão.

Ione Sak
Enviado por Ione Sak em 22/04/2011
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