CRÔNICAS URBANAS 2- Espírito da cidade

Há, hoje em dia, muitas histórias sobre os espíritos da floresta, animais que falam, dríades e monstros do pântano. Porém, eu trago aqui uma história diferente, sobre um espírito da cidade.

Estava eu voltando da padaria quando percebi algo estraníssimo, se é que esta palavra existe. Acredite você, que eu vi um poste reclinar-se. É isso mesmo, um poste, dequeles normais de concreto, cheio de fios, com uma lâmpada em cima, e que pode ser encontrado em qualquer rua de uma cidade, bem talvez não qualquer rua, mas na maioria delas. Aproximei-me cautelosa, pisquei uma centena de vezes, e concluí que eu só podia ter imaginado. Mas, para a minha surpresa, ele reclinou-se novamente, acendeu a sua luz, em plenas nove horas da manhã, e com uma voz estranha, que imagino eu, só os postes têm, falou-me:

-Sabe, humana, eu já vi tantas coisas desde que fui colocado aqui nesta rua. Já vi casais conhecendo-se, apaixonando-se, trocando beijosfurtivos à minha luz, brigando e fazendo as pazes. Já vi crianças brincando, crescendo, entrando e saindo de suas casas. Já vi carros bonitos e brilhantes, e já vi outros que não se desmontaram por pouco, já tive até a experiência de quase ser atingido por um deles. Contudo, o que mais me deixa indignado, é que existem pessoas que falam com as árvores, com animais e até sozinhas, mas nunca conheci ninguém que falasse com postes.

Me compadeci por ele, coitado parecia tão triste. Mas, minha irmã estava esperando pelo pão que eu fui comprar. Então, sem mais delongas, me resignei a dizer-lhe:

-Pois eu falo. E não é que encontrei um bem simpático.

Virei as costas e fui embora, com a certeza de que ninguém acreditaria na minha história.

Gaby Spencer
Enviado por Gaby Spencer em 22/04/2011
Reeditado em 03/08/2011
Código do texto: T2923852
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.