A namorada
           de Jesus, o Nazareno



          Começou a Semana Santa. Daqui a pouco é Domingo da Ressurreição. E quando a Ressurreição do Nazareno aproxima-se, logo me vem à lembrança o extraordinário Ticiano. Tizian Vecellio de Gregorio, pintor italiano, nascido entre 1473 e 1490, em Pieve di Cadore, e falecido no dia 25 de agosto de 1575, na encantadora Veneza.
          O versátil Ticiano, certamente inspirado no texto do evangelista João, legou à Humanidade um dos mais belos quadros religiosos, mas que sempre se revelou polêmico: é aquele que mostra Jesus ressuscitado recusando-se a ser tocado por sua amiga Maria Madalena. 
          Na ocasião, o Mestre teria dito à apaixonada Madalena: "Noli me tangere! Noli me tangere!", ou seja, "Não me toques! Não me toques!". Fugia o Ressuscitado do carinho de Maria de Magdala, naquele momento aos Seus pés prostrada, e tomada da mais absoluta surpresa.
          Me perdoem os biblistas, mas nunca me conformei com as versões ou explicações dadas a esta recusa - se é que houve mesmo - do Rabino em ser tocado por  Madalena, episódio que João, o Teólogo, narra, com detalhes, no Quarto Evangelho, cuja autoria lhe é atribuída.
          Sempre achei que a história do primeiro encontro de Jesus com Madalena, logo após haver Ele ressuscitado, continua sendo mal contada.
          O que se sabe é que a Igreja católica nunca reconheceu em Madalena a mulher que amou Jesus e foi  por Ele amada, como se marido e mulher fossem. E teriam sido, sim, segundo ousados estudiosos do assunto.
          Os livros que, sem preconceito, exploram o relacionamento de Jesus com Madalena chegam a afirmar que, ninguém entre os mais próximos, gozou de tanto prestígio junto ao Profeta de Nazaré do que Maria de Magdala.
          Por isso - e aqui a opinião é de um mísero curioso -, o Ressuscitado jamais se recusaria a ser tocado pela ponta dos dedos, da mulher que, na sua vida terrena, fora sua mais leal e doce companheira.
          Os Evangelhos contam que Madalena O acompanhou nos seus momentos de alegria e glória e esteve ao seu lado na hora do calvário, quando seus discípulos o haviam abandonado. Por onde andava, por exemplo, Simão Pedro, principalmente ele, na hora do Gólgota?
          Lembrar também vale, que Madalena foi a primeira testemunha da ressurreição, acontecimento que, de maneira inarredável, é o sustentáculo, o suporte definitivo das teses defendidas pelo cristianismo. O apóstolo Paulo, certa ocasião, pregou que "vã seria a fé dos cristãos se Cristo não tivesse ressuscitado". 
          É sabido que, durante séculos, aos católicos foi dito que Maria Madalena era a "padroeira das prostitutas"; a grande pecadora.
          Tempos depois, uma mulher que viveu se arrependendo, permanentemente, de seus pecados. 
          Arias, em "Madalena - O último tabu do cristianismo", livro que vale a pena ser lido, recorda, com todas as letras, que, a partir do seculo X, Maria Madalena foi considerada pelo Papa Gregório Magno (540-604) nada mais, nada menos do que "exemplo de perdição do mundo".
          Como, então, ligá-la a Jesus como partícipe de um romance amoroso?
          A Igreja conservadora e ranheta fazia o possível para afastá-la do Mestre, escondendo aquelas evidências que denunciavam, à farta, que entre os dois rolava, de fato, um lindo caso de amor. 
          Até que os purpurados do Vaticano, padres lúcidos, foram chegando à conclusão de que Madalena merecera de Jesus, nas suas andanças pela Terra, indiscutível e carinhosa atenção. Predileção por ela que é mostrada por todos os Evangelhos canônicos e pelos Apócrifos, também. 
          Maria Madalena, hoje, é Santa Maria Madalena.
          E, segundo li, conferiram-lhe o título - pasmem! - de "padroeira dos pecadores penitentes e das prostitutas arrependidas". 
          Só posso dizer que os pecadores penitentes e as prostitutas arrependidas devem se orgulhar de sua padroeira.
          Escolhi Madalena, essa grande injustiçada, como tema de minha crônica de Páscoa, e não me arrependo. Não porque seja um pecador e esteja precisando, urgentemente, de sua intercessão.
          Escolhi-a porque ela, conforme os Livros Sagrados, bem interpretados, não foi uma mulher banal, como chegou a ser apresentada.
          Foi, garantem os estudisos, uma figura importante na Igreja nascente. Talvez o  mais influente dos "apóstolos" do Rabino.
          Tanto que, nos Evangelhos canônicos, ela é a mulher mais citada. Neles ela aparece 17 vezes. 
Mais vezes que  Maria de Nazaré, mãe de Jesus. A ela, e não a Pedro, ou a qualquer outro apóstolo, coube anunciar que Jesus havia ressuscitado; do sepulcro, ela não arredou o pé. 
          Espero que, um dia, um teólogo corajoso anuncie ao mundo que, na realidade, Maria Madalena foi a mulher que Jesus amou. 
             
     
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 17/04/2011
Reeditado em 16/12/2019
Código do texto: T2914027
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