Bruna Surfistinha trazendo à tona a questão da venda do corpo

O que todos nos fazemos quando vamos para o nosso emprego? Vendemos nosso corpo, essa é a verdade. Eu sempre soube disso e voltei ao tema assistindo recentemente ao – de regular para bom – filme Bruna Surfistinha, com Deborah Secco. O filme não chega a ser excelente, tendo como um dos pontos fracos a previsibilidade da trama. A produção é bem cuidada, como já se esperava. Só que isso não basta para fazer de um filme um grande produto. O resultado? Apesar das inúmeras cenas de sexo – bem filmadas –, todo o filme é menos sensual do que se poderia imaginar, e também menos profundo. Mas tem, ainda assim, o grande mérito de fazer-nos pensar no assunto prostituição, que é o tema central, enfim. Na história humana, o sexo é um produto de troca que nunca saiu de circulação – o mais antigo, diz-se. Outros produtos relacionados, moedas e câmbios surgiram com o tempo.

Quem é que não se vende? Me digam. É o que faço quando fico oito horas preso em meu emprego: vendo o meu corpo.

A lingüística comparada pode nos dar pistas no caminho do entendimento da complexidade das coisas – e as coisas são complexas – assim como do reconhecimento da abrangência de certos termos.

Em inglês, "somebody" (alguém) ou "everybody" (todo mundo), por exemplo, são palavras que nos dizem claramente – sob o aspecto do pensar anglo-saxão – que as pessoas "são", antes de qualquer coisa, seus corpos (body = corpo). Você é, primordialmente, seu corpo: conjeturas metafísicas à parte.

Vender sua força de trabalho, seja que tipo de trabalho for, significa, portanto – e partindo da premissa para qual aponto –, vender seu corpo. Talvez os "herdeiros" não precisem vender seus corpos. Na verdade, quem detém poder econômico compra, sim, os corpos dos outros. E o fazem o tempo inteiro.

Importante considerarmos ainda que o cérebro também pertence ao corpo – refiro-me, com isso, ao preço do trabalho intelectual.

Vejo nos parlamentos deste nosso país promíscuo mais coisa errada do que no ofício da prostituição. Chamá-los de prostíbulos seria ofender a moral de tais casas, onde há mulheres trabalhando de verdade, sem promessas falsas, alianças imorais ou roubo.

Bem vindos, amigos, ao velho mundo da divisão de classes baseada na posse – sem medo de ser anacrônico com este uso que faço da palavra classe. Um mundo mais velho que a burguesia, mais velho que os antigos impérios. É o nosso mundo onde tudo é comprado e vendido. O único mundo que conhecemos. Um mundo que grita por tocas mais justas. Penso que esta deve ser nossa luta. Utópica e necessária luta. E... prestemos respeito a quem trabalha.

*