Senhora Razão
Tenho a cabeça nas nuvens e ando com os pés no chão.
Alguns dizem que sou centrada e ponderada e, às vezes, sou... Precisei aprender a arte do equilíbrio e a linguagem universal da Senhora Razão.
Mas a emoção sempre precedeu minha excessiva coerência e a minha lógica, Descartes que me perdoe.
Ainda sou a mesma criança que fechava os olhos para “enxergar” o vento. Não bastava vê-lo agitando as folhas que cobriam a calçada...
Apetecia sentir o vento assoprar, acariciar meus cabelos, meu rosto... Sentia seu toque!
Em meus pensamentos visualizava as mãos suaves e ligeiras da incitante ventania que me faziam cócegas.
Podia imaginá-las, e, porque não, enxergá-las!
Hoje a emoção parece incomodar as pessoas.
É como se a razão imperasse e condenasse a sensibilidade ao esquecimento.
Negligencia-se que a emoção e a razão precisam ser melodias cadenciadas. A cadência nos humaniza.
Fabricam-se robôs!
Se uma criança chora, pois perdeu seu estimado brinquedo, o adulto logo a repreende: -“Pare de chorar por isso! É só um brinquedo!” - Não! Não é só um brinquedo que se perdeu, o carinho que a criança investiu nesse objeto também sucumbiu.
E quando você perde um alguém querido? A frase que mais se ouve é: “Não fique assim! Não chore!” – Isso é cruel! É o mesmo que dizer: peça a sua dor pungente e torturante para não doer! Não sinta...
Como gosto de manter minha cabeça nas nuvens!
Como me agrada sentir meus pés no chão!
Gosto de viver e a existência é complexa mesmo!
Ainda gosto de sentir o vento pueril...
Ainda imagino como seria se no final do arco-íris tivesse um pote de ouro...
Ainda amo intensamente sentir a chuva em meu corpo...
Ainda contemplo as estrelas e tento identificar as constelações...
Ainda me emociono quando ouço as ondas do mar...
Delicio o calor do abraço,
Saboreio o encontro dos lábios,
Digo eu te amo indistintivamente, desde que o sentimento seja autêntico: para minha família, meus amigos, meus amores...
Demonstro descontentamento e tenho meus momentos de revolta, raiva, indignação...
Sou humana!
Eh... Parece que o contexto me expurga.
Demonstrar carinho, respeito, empatia, solidariedade é considerado vetusto, obsoleto... Sinônimo de fraqueza e fracasso!
Bem-vindos a cultura calcada no cada um por si.
Talvez pelo julgamento alheio eu seja uma insana.
Espontaneidade, consciência coletiva transformaram-se em “patologias”.
Se for assim, sentarei no cais de um porto qualquer e embarcarei na Nau dos Loucos como se estivesse peregrinando a bordo de um luxuoso cruzeiro, pois será esse o meu lugar.