Baile de Máscaras #1
Uma noite em minha cabeça tudo veio a tona.
Mentira; não foi tão fácil assim...
O processo de reconhecer nossos próprios erros não é nada fácil, demora um longo tempo, faz agente sofrer da cabeça e dos sentimentos; e no fim, nos tira cada gota de energia fazendo com que os fracos de espírito corram de volta para a negação de suas vidas. E não há nada pior para se viver do que a negação dos erros e da sua própria realidade; isso é mortal, mais infelizmente, é a condição em que a grande maioria de nós humanos sobrevivemos nesse mundo de aparência.
Primeiro de tudo, sofremos a desconfiança de que há algo errado em nossas mentes; uma ação que você não reconhece, um lembrete que não lembra de ter escrito, um telefonema que não lembra de ter dado ou mesmo uma conversa ou um dia inteiro perdidos no espaço-tempo entre uma personalidade fictícia e a personalidade real.
Comigo aconteceu durante alguns dias até que me desse conta da realidade. Eu já andava no automático a algumas semanas quando tomei conta de que realmente havia algo errado.
Primeiro, suspeitei do óbvio... Era só algum tipo de amnésia devido ao excesso de cerveja nos dias de bar com o pessoal da facul.
Depois, apelei para o cansaço; aquelas semanas dominadas pelas infindáveis provas, junto com as malditas leituras de “O Capital” e os rumores de greve geral dos estudantes deveriam ter me levado a um estado de stress mental tão grande que resolvi inconscientemente deletar todo aquele sofrimento como se deleta um arquivo antigo ao limpar uma pasta no computador.
Seria fácil assim...
Apenas uma resposta aos excessos cometidos contra a própria carne; nada que uma boa noite de sono, ou uma semana de folga não superasse. Mais era diferente, este cansaço, estas perdas constantes do controle já tinha se tornado algo demasiado constante para não me fazer pensar.
Podia ser um sinal, um sinal do meu corpo de que aquilo que estava errado a muito tempo tinha chegado a um limite, e acima deste limite apenas o descontrole e a total perda de minha personalidade que a muitos era reprimida e agora começava a faltar nos poucos momentos de liberdade que tinha para ser eu mesmo.
Este processo todo, a meu ver, foi o sinal de que a máscara estava tomando controle por sobre o homem. Ou melhor, as máscaras, pois naquele tempo já não sabia mais quantos e quantos personagens eu interpretava; o processo todo havia se tornado tão comum que eu encarnava minhas falsas personalidades assim logo que necessário para melhorar a aceitação no meio-ambiente em que me encontrava...
O bom filho, o estudante focado, o boêmio despreocupado, o escatológico degenerado... Tantas e tantas máscaras, tantas e tantas vidas complexas vividas uma a uma todas numa só pessoa...Tudo tão vago, e tão intenso...
Um final feliz a cada dia para um melancólico Julio que não estava mais lá já haviam anos, e que agora não mais tinha espaço pra si próprio em seu corpo.