A solução para um problema do mundo

A SOLUÇÃO PARA UM PROBLEMA DO MUNDO

(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 30.03.11)

Exatamente à zero hora e um minuto de segunda-feira passada, começo de madrugada, a população do mundo era de 6.908.514.974 almas, a acreditar no relógio demográfico mantido pelo Escritório do Censo do governo dos Estados Unidos. E, por ser de lá, ninguém há de duvidar do relógio, nem do Escritório, muito menos daquele governo, que jamais mente, frauda ou engana. Evitou-se, aqui, usar dados do governo brasileiro para que uns e outros não digam, como diriam, que, sendo o atual um governo do PT, o número na certa estaria desavergonhadamente manipulado a fim de atender a fins escusos e inconfessáveis.

Não, quem fala que somos quase 7 bilhões de humanos no planeta é o governo estadunidense. Informação de fé, portanto. Dizem que 5 bilhões seria a população ideal da Terra, em função da disponibilidade de recursos naturais (especialmente ar limpo e água potável) e da distribuição de espaço para cada um de nós, ou seja, em função de níveis decentes de qualidade de vida para todos, e não apenas para a ávida minoria que tudo leva, em abundante excesso, às custas de 95% do pessoal, que é o resto. Para que todos vivêssemos em conforto, no entanto, a humanidade não deveria passar dos 4 bilhões de pessoas convivendo simultaneamente na superfície do globo.

O que o relógio populacional não diz (e a omissão, aqui, não tem objetivos estratégicos) é a qualidade dessa gente toda. Um estudo conduzido de 1980 a 2008 pelo Imperial College de Londres e a Universidade de Harvard concluiu que um em cada dez adultos, em todo o mundo, é obeso. A mesma proporção de 10% se aplica à obesidade infantil mundial, mas este já é um dado do governo brasileiro... O que o estudo mostrou, na verdade, é que essa percentagem de gente acima do peso praticamente dobrou, e foi crescendo sistematicamente, ao longo do período observado.

É como num elevador com capacidade para sete pessoas - ou 490 kg, conforme diz a plaquinha. Três pessoas de 93 kg que entrem são, na verdade, quatro pessoas que entraram, para as hipóteses de projeto. Assim é no mundo: os sete bilhões, cada vez mais gordos, seriam quase oito pelo consumo de recursos e necessidade de energia requeridos. O projeto do planeta, portanto, estaria hoje superado. E dificilmente teremos como instalar um segundo elevador.

O trabalho também constatou que a obesidade cresceu na maioria dos países ricos como no resto do mundo. Os índices de obesidade média mais elevados foram registrados entre os povos das ilhas do Pacífico, os quais superam em até 70% as marcas da outra extremidade da lista, formada por países da África subsaariana e do sudeste da Ásia.

O problema, ou melhor, a origem do problema vem de muito longe. Há um livro por aí, bastante difundido, que conta a história. Diz o autor (supondo que todo livro tenha quem o haja escrito) que uma mulher, embora cega, pois não sabia que estava nu o marido ao seu lado, "notou que era tentador comer da árvore, pois era atraente aos olhos e desejável para se alcançar inteligência" e então "colheu o fruto, comeu e deu também ao marido, que estava junto, e ele comeu".

A solução do caso, pois, é a aparência da comida, seu aroma e seu sabor. Se nenhum desses atributos for agradável e atraente, as pessoas comerão apenas o necessário para a sobrevivência, e nem um grama mais, caindo a zero a obesidade no mundo, tornando-nos todos saudáveis e felizes.

O resto não passa de tentação, na qual caiu a mulher do livro. O que é um pecado.

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==> Lançamento do livro "Se Te Castigo É Só Porque Eu Te Amo" (teatro), de Amilcar Neves, será no dia 29 de abril, sexta-feira, às 20h30, na Barca dos Livros, em frente aos trapiches da Lagoa da Conceição, em Florianópolis.