SENSATEZ
SENSATEZ
Uma amiga me trouxe um texto de Danuza Leão e, como gosto do jeito leve e descontraído que ela escreve, sabia, antecipadamente, que iria gostar.Fala sobre suas experiências em consultórios de psicólogos e psicanalistas. Afirma que quem nunca fez, não entende quem faz. Discorre de forma engraçada e espirituosa as características de quem era cliente. Um ficava mudo o tempo todo e ela “pagando-lhe os olhos da cara”. Uma outra, psicóloga, descobriu que pela forma de se vestir ela entendia de moda e a conversa girava sobre os últimos lançamentos e outras. Parecia , segundo Danuza, que eram amigas íntimas e que estavam em uma mesinha de algum bar a “trocar figurinhas” sobre moda. Quanto aos problemas que levava para a sessão saía de lá com os mesmos. Havia um detalhe: na hora de pagar tinha que desembolsar uma fortuna para fazer jus ao “trabalho” da profissional. Continuava a mesma, com os mesmos dramas de casa, descasa, separa, solidão e outros.
Um dia, não tão belo, estava em crise e, então, resolveu consultar um psicanalista. Ia a todos os jantares, almoços que era convidada, mas pelas regras do bom convívio social, havia que retribuir a cortesia e ela não gostava deter convidados em casa. Conta seu grande drama na sessão e escuta: “Se não gosta de receber, não receba!”. Ficou curada a partir desta fala e deste dia. Nunca mais perguntou, a quem quer que fosse, o que fazer com o fato de não gostar de algo. Sua decisão deixava-a soberana, dona de seus atos, sempre em acordo com o seu desejo.
Seu exemplo é um bom caminho para guiar a vida. Na verdade, já afirmei que o homem normal é cheio de conflitos, de indecisão. Só os psicóticos tem a certeza das coisas. O normal questiona, duvida, implica, escuta opiniões dos outros, mas no fundo tem que saber que a responsabilidade é sua por suas decisões e as conseqüências também. Não há como saber se a decisão tomada foi a mais acertada, não há mágica, não há “bola de cristal”, mas há a sensatez, o discernimento, a ponderação.
O bom é ter clareza sobre as coisas, o saber expressar o que quero, o que é melhor, o que me faz bem, o que me dá prazer, o que me constrange, o que me incomoda,o que me faz falta(somos todos faltosos e já nascemos assim). São todos questionamentos que fazem com que tenha maior discernimento sobre como tocar a vida. O meu desejo tem que ser escutado, embora, às vezes, use de artimanhas para não ser enxergado, de camuflagens para disfarçar o que está pulsando.
Visitava semanalmente, aos domingos, os meus pais, levando meus meninos pequenos para passar a tarde em sua casa. Tornou-se uma obrigação e terminava deixando de ser prazeroso. Consegui conversar com eles e mudar este hábito. Ia lá quando queria, até mais vezes na semana. Não foi fácil falar, porém era o mais viável. Há situações que se torna difícil romper, mas é seguir o caminho do coração.
Voltando ao texto que li. Fala ela no constrangimento em dizer ao profissional que não voltará às sessões. Faz parte também do processo de análise o saber lidar com esse tipo de situação e dar um basta. Passei por uma experiência assim com meu primeiro analista. Era frio, calculista, exigia o pagamento das sessões em espécie (não aceitava cheques e não se usava cartões, na época). Estava controlando minha vida e senti que não gostava de seu domínio. Criei coragem e disse-lhe que não voltaria às sessões. Ligou-me algumas vezes e eu estava irredutível. Sei que foi o melhor para mim. Depois tive excelentes psicanalistas e, vez por outra, sinto falta das suas escutas.