Espelho, espelho meu
Me olho no espelho. É, preciso cortar o cabelo. Geralmente, quando a minha franja toca meu olho já é época de cortar. Esses mês, não sei porque, não cortei. A doença me deixou mais relaxado.
Minhas olheiras estão inchadas. Sempre tive olheiras, tenho insônia. Por isso estou agora ás três da manhã me olhando no espelho e achando meus defeitos. Não que eu precise procurar bastante, meus defeitos são bem visíveis.
Esse nariz, por exemplo. Parece o nariz do Asterix! O pessoal sempre falava que eu tinha um nariz batatudo mesmo; minha mãe colocava a culpa na família do meu pai e vice-versa. Desenterravam uma tia lá de Mossoró que tinha um nariz igual ao meu e coisa e tal.
Eu gosto de deixar a barba crescer, mas não muito. Seria bom se ela ficasse como está agora: rala. Nem barbado, nem barbeado: é assim que eu gosto.
Nossa como estou magro! Eu não havia percebido isso. Parece que meu pescoço murchou. Quando puxo a respiração dá até pra ver duas veias enormes saltando dele. Desconjuro!
Uma vez fiquei magro assim: 45 quilos. Mas o médico me garantiu que era coisa da idade, do crescimento, puberdade, essas coisas. Agora, depois de tanto tempo, fiquei magro de novo.
O pior é que eu estava pensando em me arrumar para amanhã, quando voltarei ao trabalho, por isso estou vendo o que posso fazer. Mas essa magreza... isso não dá pra mudar de um dia para o outro. Barbear é fácil, cortaro cabelo também - só ir ali na esquina -, mas engordar uns 10 quilos da noite pro dia... ah, isso não, meu amigo. Bem, já que estou no hospital eu poderia pedir para operarem meu nariz, pelo menos. Não, melhor não. Foi assim que começou o Michael Jackson...
Continuo me olhando no espelho. Acho que vou me barbear amanhã mesmo. Amanhã é o dia! Não sei porque não me sinto entusiasmado para voltar ao trabalho. Doente, eu só pensava nisso. Em fazer algo, em ser útil. O Millôr já dizia: "Pode crer, meu amigo, com um dia de doente já aprendo a morrer". Era mais ou menos isso. E era mais ou menos isso que eu sentia. Agora, sumiu! Sei lá, desapareceu... É só a morte cruzar a esquina que a rotina me faz resmungar de novo.
Quer saber, eu vou é pra cama agora tentar dormir. Até amanhã, espelho.