“Nós somos bons nisso!”
“Nós somos bons nisso!”, pensei.
Fechei os olhos e uma lágrima pediu pra sair. Não deixei. Eu sabia que você não gostava de me ver triste. Por mais que sempre reclamasse que eu escondia a verdade sobre meus sentimentos e, em momentos de muito nervoso, até me chamasse de hipócrita, eu sabia que você preferia ver sempre um sorriso estampado em meu rosto, mesmo que fosse puro fingimento. Você não sabia lidar com minha versão triste. Eu te entendia. Quem ia gostar de ver alguém chorar, não é? O problema é que a dor que invade meu coração toda vez que percebo que o “nós” já ficou no passado é tão grande que fica difícil fingir. Me afasto. Finjo que estou pensando em qualquer outra coisa... A televisão! Eis minha salvação. Que ironia... Está passando “Closer, perto demais”. É... Definitivamente esse foi o problema, ficamos perto demais. Tão absurdamente próximos que conhecíamos até o que não queríamos conhecer. Invadimos demais o espaço um do outro. Eu quase consigo fingir que está tudo bem. Mas você não deixa. Me pede para olhar nos seus olhos e sobe em cima de mim. É sempre assim, eu me despeço e você pede “fica!”, digo que cheguei e você me pergunta “por quê?”.
Qualquer hora tomo coragem e me mudo de vez, abandono você com todo seu egoísmo e o jeito frio de dizer que eu faço tudo errado. Só falta coragem.
Desvio meu olhar do teu e tento me refazer. Você segura meu rosto e diz que nunca vai me perder. “Nós somos bons nisso”, eu penso. Parece novela das oito, drama de filme, enredo de livro com gosto adoçado demais: quando ela quer, ele não pode, quando ele quer, ela deixou de querer... Mas volta e meia se esbarram, tentam lembrar porque mesmo que não deu certo, falam alguma besteira e se magoam. Mais uma vez.
Seu corpo pesando sobre o meu não permite que eu me esconda ou saia correndo como eu quero. Na verdade não quero... Mas preciso mentir pra você! Onde já se viu dar o braço a torcer e dizer com todas as letras: “Eu amo você!”?
Você me beija daquele jeito que não dá pra resistir. Arrepia cada pelo do meu corpo e me faz insistir: “Nós somos bons nisso!”
Será que só eu me lembro dos bons momentos? Daquela vez que eu decidi querer comer bolo com glacê... Quem mais iria buscar pra mim à uma hora da madrugada? Só você! E aquela vez que assistimos “Uma prova de amor” e eu chorei o filme inteiro? Não sei se teria sobrevivido sem seu abraço. Não sei se teria sobrevivido a muitas coisas sem você.
Nossos filhos tinham nome, nossa casa já estava planejada e a gente pensou até em... Até em que mesmo? Tudo isso ficou meio perdido no caminho e o desejo de mostrar pra todo mundo que estávamos juntos, com direito à aliança de compromisso, ficou guardado em alguma gaveta. Quem sabe um dia se torne um poema bonito.
Frases clichês, apelidos carinhosos, melhor abraço do mundo. “Nós fomos bons nisso”.
Fico triste. A frase mudou! O presente já não é como o passado. Erro meu ainda procurar nessas migalhas de encontros furtivos algum vestígio do nosso velho amor.
Nós mudamos muito. E nem sei se foi pra melhor. Talvez a gente realmente nunca se esqueça um do outro e fique uma eterna vontade de que tivesse dado certo. Foi bom!
Você puxa meu cabelo e me diz que sou linda. Eu quase acredito. Não fosse esse vazio enorme que estou sentindo ia fingir que está tudo bem e deixar as coisas como estão. Não consigo. Pergunto pela última vez: “Você não quer mais?”. E como sempre você diz “Não sei”. Sinto raiva de mim. Eu sempre sei a resposta, e sei também que ela significa “não”. Mas é um “não” que você não quer dizer. Uma “não” que eu não quero ouvir.
E continuamos assim, fingindo que está tudo certo e deixando cada vez mais que uma relação bonita termine em um “não sei o quê”. Já estou quase esquecendo... Por que mesmo eu gostava de você?
Esse é o perigo em insistir demais em algo que já se mostrou inadequado, a gente acaba perdendo a essência.
Essência... Seja qual tenha sido a nossa, nós fomos bons nisso!