UM PROFETA NUNCA MORRE
É preciso que o grão de trigo morra, para que se reproduza em tantos outros. O grão sepultado na terra, por um momento provoca momento de tristeza, uma sensação de perda irreparável, mas se quisermos que ele se multiplique, esse processo se faz necessário. Num tempo árido de profecia, a partida definitiva de um profeta provoca uma sensação imensa de vazio. José Comblin, profeta de 88 anos, abre um espaço enorme na caminhada da Igreja que quis ser e continuou sendo povo.
Em época de “glamour” eclesial, de aburguesamento da vida consagrada (religiosa e sacerdotal), perder alguém que alimentava a travessia teimosa da fé dos pobres é muito doloroso. Quando mais precisamos de verdadeiros adoradores em espírito e verdade, a vida nos ceifa sem avisar-nos um dos exemplares mais autênticos da identificação com o mestre. Em tempos idos, dos místicos, Francisco de Assis, Pe. Pius e outros, a identificação mais objetiva com Cristo eram os estigmas. Em nossa época, de solidão e abandono dos pobres à própria sorte, a verdadeira identificação com o Mestre é a vida com os pobres e pelos pobres. Neste sentido Comblin representava uma geração de homens e mulheres, que se tornou verdadeiramente cristã.
A maior ventura de tudo isso, é que a semente quando morre não fica mais única e sozinha; em algum lugar irá arrebentar a terra brotando novos profetas. O Espírito de Deus é dinâmico, grandioso, inteligência e com certeza fará germinar novos profetas lá onde menos esperamos. Para quem ainda pensa que ser cristão é ter a emoção à flor da pele, é adorar histericamente um Espirito desencarnado, ou rezar em latim, embatinar-se, colha da vida deste profeta uma centelha de consagração.
Não era relaxado, não fedia, não vivia em maloca, pois era povo e como o povo ele vivia com dignidade. Não comungou do pão dos coronéis, nem bebeu do cálice dos poderosos. Não negociou os tesouros da fé (sacramentos) com os “benfeitores”, mas fez de sua vida o mesmo sacrifício da vida dos empobrecidos brasileiros. Fez ecoar a sua voz e sua profecia, quando percebeu que o pecado das estruturas politicas destruía a vida do povo e a “Mater Ecclesia” silenciava, como que compactuando com a sede dos poderosos leviatãs do sertão e dos serrados brasileiros.
É claro que um profeta é uma pedra no sapato, um aguilhão que não deixa em paz quem desfruta dos benesseres do poder. Por isso pode ser que a morte do Profeta Comblin para muitos seja um alívio, mas para o povo que bebeu da mística da sua profecia será um grande momento de soerguimento. É para homenageá-lo, e ao mesmo tempo para lhe ser grato, o sonho que ele ajudou embalar deverá continuar mais vivo e mais forte. Os “profetas” midiáticos, os meteoros do evangelho da prosperidade, as estrelas e astros dos mega shows, vão perdendo seu brilho e a sua força, mas os profetas que se forjaram nas ruas sujas dos guetos e das estradas encardidas do Brasil, vão se fortalecendo e se multiplicando com o vigor do verdadeiro evangelho, que sendo água viva, faz sustentar a vida na vida do povo.
Comblin, assim como Elder Câmara e todos os profetas e profetizas de verdade, você continuará a iluminar esta Terra de Santa Cruz, da qual ninguém e nenhum decreto lhe expulsará, pois viverá na terra fértil dos corações de cada brasileiro e brasileira que amam de verdade o evangelho. COMBLIN VIVE! VIVA O COMBLIN!