A teoria do ovo

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... E Colombo, ‘batendo levemente contra a superfície da mesa, quebrou um pouco da casca; graças a este pequeno achatamento, o ovo se manteve perfeitamente na posição vertical’. Eis o milagre ovíparo de Colombo! Mentira! É que Colombo usou a teoria do ovo e, mesmo não tendo sido o autor da ideia, entrou para a história em detrimento do seu real idealizador, o arquiteto florentino Filippo Brunelleschi.

Lendo e relendo o trecho acima, parte dele picotado de arquivo visto casualmente na internet, senti-me o próprio ovo do navegador genovês! E pra quem é homem, fica a deixa: ‘ovo achatado dói demais da conta! Infelizmente, tem gente que gosta de chiliques no ovo! E ai do puxador quando o puxado gosta...

Os atuais babões ou puxadores de saco – o saco tem ovo (ou seria o ovo quem teria saco?) – talvez não se recordem ou quiçá desconheçam a origem da expressão, mas os famosos abre-e-fecha-porta de hoje tem sua etimologia ligada a uma fruta, diferentemente da secreção de cloacas desavisadas...

À época dos feudos , era comum que as maçãs, antes de serem entregues aos senhores feudais, fossem polidas. Um áulico serviçal, após retirar das frasqueiras reais uma fruta do pecado, esfregava-a na roupa e somente depois a oferecia ao seu senhor. Surgia assim a figura do apple polisher (polidor de maçã); numa tradução mais simples, vulgar e atualíssima, poderia ser adaptada para: babão! É, amiguinho (a), ser babão de carteirinha não é privilégio nosso, homens e mulheres do Século XXI, não! Isso vem de longe, de muito longe, a long time ago ... Não usei aqui a pejorativa expressão ‘chupa-ovo’ única, exclusiva e simplesmente em respeito ao ovo de Colombo, coitado, que depois de achatado ficou em pé!

Sempre me reporto a refletir sobre cenas assim e tento imaginá-la como espectador... E confesso: não consigo enxergar a cara de sem-vergonha do sem-vergonha que se presta a esfregar maçã nas calças e a entregar, sorrindo, para outro não menos sem-vergonha que a recebe, morde-a e toma gosto nos beiços! Aqui, todavia, cabe outro aforismo: ‘o que seria dos bajuladores se inexistissem os amante da bajulação?’ ou então: ‘o que seria dos protegidos se não fossem os protetores?’

Voltemos à Teoria do ‘Ovo’... Esse ‘Ovo’ escrito meio vesgo e assimétrico, um maior e o outro menor, foi proposital porque é por causa da Teoria do ovo que os ovos postos variam, dependendo da cloaca expedidora . Ou então, se você gostou da metáfora dolorosa do ovo achatado, digamos que o maior foi justamente o achatado que inchou...

No reino lá do tal senhor que gosta de comer maçãs, existem vários serviçais, muitos dos quais competentíssimos, abnegados, corretos, mas, coitados, não sabem valorizar o ovo que põem! Trabalham. Trabalham. Trabalham. E trabalham. Infelizmente, eles só aprenderam isso e só trabalham. Tudo que executam sai a contento. Nunca se abstiveram das atribuições. Mesmo assim, são esquecidos, apenas mais um... Não aprenderam a botar ovos!

As genuínas galináceas, ao expelirem ovos ricos em vitamina B e E; com a casca apatacada de cálcio; com a gema fonte de ferro, colina, ácido fólico, lecitina, biotina, antioxidantes, luteína; apresentando propriedades aglutinantes, anticristalizante, aromatizante, coagulante, corante, emulsificante, espumante; prevenindo alergias, Alzheimer, artrites; prevenindo degeneração macular senil ou cegueira da idade, doenças cardiovasculares, infecções infantis, osteoporose, Parkinson... Essas coitadas jamais se imaginariam, assim como eu nunca consigo me enxergar, vítimas de oportunistas que se utilizariam delas ou da teoria delas para destacarem-se na vida!

Diriam elas:

– Gente! A cor do ovo diz apenas qual é a cor da mãe! Se o ovo é branco a galinha é branca; se o ovo é vermelho, mãe red ! E se você vende ovos não precisa colocar no outdoor nem nos modernos busdoor: ‘Ovo grande, branco, brilhante, gostoso, nutritivo...’ Quem vai comprar vai ver como o ovo é! Ponha apenas assim: ovo. E se for colocar algo do tipo ‘vende-se’, não esqueça que: vende-se ovo é o correto; e se o empreendedor quer vender mais de um: ‘vendem-se ovos’, por favor! Um ovo é vendido; dois ovos são vendidos. O ovo não tem ‘m’, mas ele precisa estar lá no plural!

Esse seria, certamente, o papo entre galinhas e a gente, os galinhas – os expropriadores da qualidade de botar ovo!

– Amigo! Vai enrolar até quando? Afinal de contas, e a Teoria?

– Calma, gente! Não posso nem vender meu ovo! A Teoria é bem simples! Quando fizer algo, saia feito galinha, cocoricando para todos os lados, de preferência para os lados onde os ventos sopram, levando o seu cocoricó para junto dos chefes... Chefe adora cocoricó! Avise pra todo mundo que você pôs um ovo! Não importa se você é branco, vermelho, amarelo, apenas valorize o seu ovo com incomparáveis cocoricós! Isso parece simples, mas não é fácil! Nem todos no reino conseguem essa proeza, mas o trono é de quem faz a diferença...

Usurpando-me da finalização do memorável Colombo noutro trecho do mesmo texto retirado da internet, ele, depois de ser provocado pelo cortesão, arremata:

‘– Uma vez que mostrei o caminho para o Novo Mundo, ‘qualquer um’ poderá segui-lo. Entretanto, ‘alguém’ teve antes que ter a ideia. E ‘alguém’ teve, depois, que se decidir a colocá-la em prática.

Infelizmente, mesmo depois de (re)descobrir a Teoria do ovo, continuo tendo meus incontroláveis comichões ao imaginar-me como galinha e meus cocoricós!

Crato-CE, 28 de março de 2011.

02h34min

Nijair Araújo Pinto
Enviado por Nijair Araújo Pinto em 29/03/2011
Reeditado em 24/08/2011
Código do texto: T2878353
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