PROFESSOR JOSÉ FRANKLIN
Professor Franklin era muito conhecido e reverenciado em Aracaju pelas suas comprovadas habilidades como mestre e intérprete oral da Língua Inglesa. O pouco que digo nesta crônica menos ainda significa diante da figura excêntrica, gigantesca, desse homem que ainda preenche o imaginário de muitos de seus ex-alunos, colegas de profissão, amigos e familiares.
Eu estava pelos 14 anos de idade quando ouvi as primeiras falas sobre o lente do Atheneu e da Escola Normal Rui Barbosa. Então, neste caso, nem eu mesma confio mais nos meus registros da memória que já vão se esvaindo nas nuvens e no azul do céu de minha cidade. Entretanto, ainda é tempo e também indispensável falar de uma pessoa de tamanha importância.
Infelizmente não fui sua aluna, mas ele era do tipo SELO DE QUALIDADE, isto é, se foi aluno de Franklin, nem era necessário ser testado, pois a credencial mostrava-se mesmo inquestionável. De olhos fechados era total a confiança depositada em felizes discípulos desse senhor.
Não fui sua aluna, como já o disse, mas eu o via pelas ruas do centro de Aracaju e também nas escolas anteriormente citadas. Franklin, do que ainda me recordo segundo informações orais, além do inglês fluente, dominava outras línguas e conhecia muito bem o grego. Diziam que fazia a interpretação em várias ocasiões como, por exemplo, comunicando-se com marinheiros e comandantes de navios que por aqui passavam oriundos de outros países. Seus méritos eram também reconhecidos na tradução de textos escritos.
Não tem como ser apagada da memória, porém, a figura do homem Franklin. De estatura mediana, tez morena, bronzeada pelo sol da Ilha de Santa Luzia (Barra dos Coqueiros), onde residia. Cabelos castanhos mais para o tom entre o médio e o escuro, esvoaçantes, entradas de calvície um tanto profundas, sobrancelhas fartas e de fios arrepiados, dentes muito bonitos e branco acinzentados. Andava sempre metido em um terno de linho, amarfanhado, e que parecia fazer parte integrante do seu corpo _ uma segunda pele, pois era sempre aquele o seu traje. A camisa branca mal colocada por dentro do terno _ mal abotoada também, pois os botões superiores que fecham a gola da camisa onde deveria ser arrumada a gravata estavam sempre fora das casas ou postos em posições diferentes das que deveriam estar. Por cima da camisa a gravata vermelha, meio desfeito o nó, como se aquela peça do vestuário masculino o incomodasse ou impedisse a respiração. Andava sempre com uma pasta sob o braço, livros ou outros objetos relativos à profissão do magister. Absolutamente prestava atenção ao que dele dissessem ou pensassem, tinha o rosto erguido, os olhos castanhos firmemente olhando para o céu. Andava pelas ruas para lá e para cá, como se não tivesse uma rota ou pouco ligasse para rotas.
Franklin enchia as ruas com sua voz inigualável. De um tom de voz como aquele também não é possível esquecer! Falava nos idiomas que aprendera e parecia estar dialogando com os anjos ou mesmo com Deus. Havia sempre em seu rosto uma expressão de glória, de prazer e de a si mesmo bastar-se daquela forma. Ele também declamava, acredito que longos poemas das literaturas de língua inglesa. Quem não se encantava com o professor que conhecia línguas estrangeiras?
Por outro lado, criou-se um folclore sobre José Franklin. Contavam seus alunos que tinham que quase quebrar as mandíbulas e morder a língua porque ele era muito exigente com as noções e exercícios de fonética. E aí é que falava mais e mais alto. Se houvesse na sala uma janela de cristal, esta se estilhaçaria. Outros alunos, desses do tipo danado, diziam que na próxima aula teriam que levar um guarda-chuva. Eram estudantes da primeira fila e que afirmavam tomar banho de saliva quando o apaixonado pela língua inglesa colocava a língua entre os dentes para ensinar a correta emissão do th. THEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEE...
O pior do que espalhavam os estudantes era que o professor não tomava banho e, incluíam que, quando chovia, a canoa em que vinha da Ilha de Santa Luzia para o atracadouro, em Aracaju, emborcara e o professor, assim, e só assim, teria tomado banho.
O professor Franklin, na verdade, é um patrimônio da nossa cultura e, ter podido acompanhá-lo em muitas das cenas do cotidiano de Aracaju, capital de Sergipe, é uma espécie de bênção.