Eu não queria escrever esse texto, não precisava fazê-lo, ou melhor, eu necessito escrever, preciso falar comigo mesmo

Eu realmente não queria escrever esse texto, não precisava fazê-lo, ou melhor, eu necessito escrever, preciso falar comigo mesmo. Passo por um drama que é comum a todos, mas é muito duro com quem sente, a morte de ente querido. A minha mãe, doente há mais de ano, morreu ontem vítima de câncer, os médicos disseram quando do diagnóstico:

-Tem 10 meses no máximo um ano de vida!

Acertaram! Sim, vem o choque, a fragilidade da vida, ninguém é eterno, mas mãe deveria ser. Essa pequena senhora de oitenta anos que viveu para criar seis filhos homens e que eu conheço há 55 anos e não sabia que tinha total dependência dela, sinto agora um enorme vazio, falta algo em minha vida, essa mesma vida, o trabalho e a família que me afastou um pouco do convívio com a velha teimosa, que preferiu morar sozinha a viver em casa alheia, que nunca quis causar incomodo e sempre disse:

- Casa que tem duas mulheres não dá certo, pois só uma deve mandar!

Referia-se ao convívio com as noras (por sinal todas excelentes pessoas) e para evitar dar trabalho, vinha sempre como visita, minha mãe tinha total conhecimento do que se passava com toda a família, desde os filhos até os bisnetos passando por noras, parentes, amigos, agregados, etc. sabia de tudo e sempre queria resolver os problemas de cada um, sem delongas dizia o que achava certo ou errado em cada situação.

Minha adorada mãe penou muito neste ultimo ano com a doença, tratamentos, internações, dores, no final eu pedi a Deus para levá-la e acabar com tanto sofrimento e agora sinto muito sua falta.

Arrependo-me de não ter dito o quanto a amava e respeitava, sempre pensei que ela sabia e que amor de mãe e filho é para sentir não para falar.

Que pena essa minha deficiência de comunicação que tento suplantar, quem mais sofre com isso sou eu mesmo... por não dizer o que sinto, de ser racional, controlar minhas emoções, de saber que homem não chora, que sou equilibrado, etc. Alguém muito perto me disse que sou uma ostra que não demonstro sentimentos. Que bobagem! amo minha família, esposa, filhos, meus irmãos e suas famílias, os amigos e as pessoas que me cercam, só falta dizer a eles!

Nessa viagem de trem que todos fazemos com destino a morte, os trilhos são o amor que transmitimos e sentimos, que quanto maior torna mais feliz e tranqüila é a viagem, de resto os vagões com os passageiros apenas seguem a locomotiva desgovernada.

Paulo Melo
Enviado por Paulo Melo em 23/03/2011
Código do texto: T2866250
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