Prato de massa
Jamais conhecerei ninguém mais egoísta do que ela. Reza e jamais perde uma missa o que não lhe modifica a solidariedade vazia.
Deixa mofar o pão para dar aos pobres, alguém pode precisar. Tudo gira em torno de sua vida boa e generosa. Herdou tudo e jamais lutou para pertencer à sociedade competitiva e burra. Salvou-se dela continuamente observando sua inclinação para não contribuir com ninguém.
Resultado de seu enriquecimento através de orações mesquinhas que ativam seu isolamento; percebi o quanto algumas vidas são incapazes de tecer um elogio durante a vida. São estas criaturas excepcionalmente ferinas.
Nesse dia resolvi ir parar na cozinha e dar tudo de mim. Gosto de cozinhar e aprecio macarrão como um Chinês deve gostar. Caprichei. Levei a mesa um prato de revista.
Ela provou, emitiu um langoroso gemido e perguntou:
— Que massa é essa?
Respondi que era a minha própria massa.
Ela insistiu.
— Quero saber a marca.
— É espaguete seco João que vem enxuto dentro do pacote feito por mim.
Disse tentando despertar qualquer coisa em seu coração frio. Ela resmungou sem muita convicção qualquer coisa dizendo que aquela qualidade de massa estava boa.
Passei para o ataque. Bem não seria boa caso alguém faltasse com a dedicação na cozinha. Calou-se. Retruquei.
— A senhora não gosta mesmo de elogiar.
Estava já no terceiro prato cheio. A resposta veio rápida e lacônica.
— Não, gosto apenas de mastigar.
Quantas vidas desmoronam por causa de valores mal aquilatados!