O JOGADOR

O problema do jogador é que ele jamais se lembra do fim nem do começo de nenhuma partida. Jogador é aquele sujeito, ou melhor, aquele objeto (o jogo é o sujeito) que está sempre no meio da partida sem começo nem fim.

Não importa se antes do início da partida ele, jogador, dispõe de muito ou de pouco dinheiro para a aposta. Não importa.

Não importa se no fim da partida ele, jogador, está sem nenhum centavo ou dispondo de uma fortuna. Não importa.

Nenhum desses dois é, verdadeiramente, o jogador. Esses dois, seja como for, têm corpo completo, com cabeça, tronco e membros. O verdadeiro jogador é apenas composto de olhos e mãos, como bem o descreve Stefan Zweig em seu magistral conto “24 horas na vida de uma mulher”.

Jogador é aquele que joga com a própria vida e com a própria morte, como se estivesse a jogar bolinha de gude consigo mesmo em algum antigo quintal de infância. O jogador é sempre um suicida que se adia.

Há quem jogue sempre apenas consigo mesmo, sendo sempre o outro, o vencedor.

Há quem não jogue jamais consigo mesmo, exatamente por saber de antemão que seria sempre ele próprio o perdedor.

Há quem não jogue nunca (julga que não) consigo próprio nem com outros parceiros nenhuns. Este, de todos e sem suspeitá-lo, é o mais inveterado jogador, aquele sempre perdido no centro da partida que não sabe estar jogando, aquele para sempre prisioneiro na rua sem-saída do jogo em que se ignora, do jogo em que não há jamais um vencedor.

Na tarde de 22 de março de 2011.