A leitura e o estudo da Poesia nas Universidades

Pensar o que é o POEMA é uma atitude necessária.

Nas andanças por textos literários, de inúmeros poetas da Língua Portuguesa de diferentes escolas literárias, descobrimos grandes poetas pouco reconhecidos pelo cânone e outros que muitas vezes são reconhecidos dentro do cânone e que nós não consideramos tão bons poetas, assim! questionando suas inclusões.

Eu leio inúmeros poetas brasileiros, e tenho um referencial particular de grande literatura ou não nos poetas que leio. Foge do meu alcance o poder da crítica literária sobre a reputação deste ou daquele poeta, deste ou daquele poema. Faço as minhas escolhas, embasadas em conhecimento advindo das leituras dos poemas dos poetas, primeiramente e da poemática e não apenas através das resenhas/teses/estudos/livros de análise literária, etc. É um pouco subjetiva a constatação do bom poeta, dirão, vocês. Escolhas são escolhas. No início, certamente, que sim! Depois, creio eu, a prática da leitura e interpretação nos dá o olhar clínico para reconhecer o talento ou o lugar comum de um poeta.

Esta semana, surpreso leio, a beleza da Obra do poeta parnasiano: Valentim Magalhães e seu livro Rimário publicado em 1900 que reúne os seus poemas escritos de 1878 até 1899. Quem disse só existir o quarteto: Olavo Bilac, Raimundo Corrêa, Alberto de Oliveira e Vicente de Carvalho no Parnasianismo Brasileiro? E quem pode afirmar que toda a Poesia escrita por Carlos Drummond de Andrade é brilhante? Tem poemas simplórios em sua obra, também!

É necessário se desarmar de preconceitos para ler Poesia. Não é definitiva a lista dos grandes poetas universais. Certamente, na estante onde estão os maiores, cabem outros exemplares e até podemos substituir alguns dos poetas presentes. O mundo literário gira em torno das influências sociais e dos gostos de cada tempo da História. Quem tiver o poder de ditar o modismo de seu tempo poderá ditar o que julga bom em termos de Literatura e o que julga ruim. Poderá tornar o fraco: forte e deixar o forte no ostracismo literário.

Eu fico abismado em lembrar que não tive aulas nem li no curso de Letras (anos 90) da mais conceituada Universidade da América Latina, a USP, poetas Parnasianos, sequer uma aula tive de Poesia Parnasiana. Apenas discutimos um poema de Olavo Bilac: Vila Rica em contraponto de poemas dos modernistas sobre as cidades mineiras do Ciclo do Ouro no Brasil Colônia.

O que adentra no íntimo do pesquisador de nosso tempo acaba por perfilar como o que deva ser lido e estudado em Poesia. É a concepção literária do tempo que estamos a presenciar que nos é ensinada. Se não formos curiosos, leremos, também, o que não é tão valioso sendo convencido que é valioso, por pertencer ao modismo de agora, e perderemos a noção da beleza da Poesia parnasiana de Valentim Magalhães, Gonçalves Crespo, Belmiro Braga, Colombina (Yde Schloenbach Blumenschein), Humberto de Campos, Emílio de Menezes, Luiz Delfino, Martins Fontes, etc. E pior, das escolas literárias que os críticos literários do tempo em que vivemos creem valiosas poderemos ler apenas alguns escritores e outros de enorme valor serem esquecidos do incentivo à leitura e ensino/discussão dos seus poemas. E pelo simples fato das influências sociais que um poeta de pouco valor literário tenha, ele pode ser lido e estudado, e um grande poeta ser esquecido por completo.

Infelizmente, no Mundo Acadêmico há uma procura de visibilidade por boa parte do pesquisador/acadêmico, este busca se inserir no universo dos pesquisadores/acadêmicos e por uma questão de sobrevivência financeira, espaço acadêmico ou talvez, vaidade (em alguns casos), aceite o cômodo de estudar os poetas “de sempre”, impedindo, num ciclo vicioso, que seja democratizado o conhecimento e circulação da grande Poesia Brasileira de todos os tempos literários. Poesia divulgada em alicerce seguro: o da qualidade. (Muitas vezes os grupos de estudos da Universidade são determinados por um assunto, ex.: Grupo de estudo da Poesia de Murilo Mendes e o pesquisador se insere nele, para uma pesquisa maior, dirigida pelo mais conceituado professor daquele grupo).

O que é mais vantajoso para o status/inserção do pesquisador no Mundo Acadêmico: estudar Valentim Magalhães e o parnasianismo, Dário Vellozo e o Grupo Cenáculo (grupo paranaense de poesia simbolista) ou estudar Carlos Drummond Andrade e a poeta Cecília Meireles? O segundo grupo, certamente, é mais seguro. Imaginemos a cena: está chegando para palestra o pesquisador da obra de Cecília Meireles (o auditório cheio, aplausos, perguntas, etc.), isto, ocorreria, com a mesma intensidade se o palestrando discursasse sobre a obra de Valentim Magalhães?

Nós precisamos resgatar a Poesia brasileira, na sua totalidade. Pesquisador acadêmico brasileiro, acredito assim, não precisa buscar o fácil, a visibilidade imediata, o status social ou qualquer artifício para ver divulgada, publicada a(o) sua(seu) resenha/tese/estudo da obra literária de algum poeta do cânone. Deveria, isto sim! Colaborar no resgate dos Mestres esquecidos de todos os tempos literários no Brasil e ajudar na divulgação deles, realizando assim, um papel de compreensão totalizante de nossa Literatura e o papel dela no desenvolvimento cultural, social e humano do Brasil dos seus primórdios até hoje. Afinal, a Poesia é ao mesmo tempo um referencial social e humano (interioridade do poeta) e Ela possui a riqueza de desnudar nossa brasileirice/brasilidade de ontem e de agora, com a duplicidade: realidade objetiva e subjetiva aos nossos olhos e sentimentos postas nos poemas de todas as escolas literárias que no Brasil se desenvolveram.

Será que a Universidade está preparada para esta empreitada?

É triste ver um pesquisador de Literatura que tem preconceito para com a Poesia Clássica ou vice-versa, para com a Poesia Moderna. Quem quer estudar Poesia na Universidade deve, primeiramente, ler e estudar diversos poetas brasileiros de todas as escolas literárias, os conceitos e formas de construção poética dos Mestres dessas escolas e depois, sim, informado e despido de preconceitos literários, se tornar um pesquisador de algum autor específico, de uma escola literária restrita, de um momento restrito da história literária, etc. Certamente, que sem preconceitos e conhecimentos da Poesia e da Poemática nascerá o amor por inúmeros poetas de todas as escolas literárias e o prazer em estudar/pesquisar a fundo a poética de muitos deles.

O grande Pesquisador/Docente de Poesia conhece a fundo o seu material de estudo. Deve amar a Poesia e os poetas. Estudar primeiro a fundo a Poesia e a Poemática, para depois adentrar na Vida e Obra de um Poeta ou no universo poético de uma escola literária, qualquer que seja ela, jamais o contrário!

Penso eu, para terminar, que a Poesia é bonita demais para ser estudada: academicamente por quem não a conhece em plenitude! Não pensam assim, amigos leitores?