MEMÓRIAS DE UMA INTERNA - IV
Os amores platônicos eram constantes em nossos coraçãozinhos. Quantos sonhos, quanta alegria quando nosso eleito se dignava a prestar atenção em nós, quantos flertes intermináveis, quantos cochichos entre os enormes muros que não nos permitiam ver a cara do amado! Amei desesperadamente um menino com a cara do Jerry Adriani... Eu e mais da metade das meninas! Ao descobrir que o belo Jerry dava bola para todas, caí fora. Aproveitávamos todas as chances quando saíamos dos internato. Quando éramos levadas a um campinho frente ao colégio, numa missa, um jogo na quadra de esportes da Igreja, uma matiné aos domingos... E sempre seguidas, discretamente, por um séquito de meninos. Éramos odiadas pelas externas pois, sendo novidade e de acesso difícil, éramos as preferidas dos garotos. As vezes aconteciam imprevistos que resultavam numa reprimenda e na interrupção do passeio. Lembro de duas situações, hoje hilárias, mas dramáticas para nossa vida na época. Um piquenique à beira do rio Jaguari, num local bem escondido pela vegetação. Todo mundo dentro d'água, de uniforme de Educação Física! Que consistia num calção e um vestido tipo saiote! De repente um grito! Uma das freiras vislumbrou, entre a vegetação, um grupo dos nossos enamorados, olhando extasiados aquela cena sensual. Resultado: juntar tudo às pressas e retornar para a prisão, digo, ao internato! Noutra ocasião, a responsável pelo retorno antecipado fui eu! Passeávamos na avenida principal, escoltadas por quatro freiras; um belo motorista botou os olhos em mim e a paquera começou. O carro nos seguindo, não deu outra. Aquele flerte explícito foi um escândalo e resultou num novo toque de recolher. Ainda bem que nenhuma de nós culpava a outra por esses desastres. A cumplicidade entre as meninas era algo de belo! Num meio frio e destituído do afeto familiar, nos apegávamos uma a outra formando uma grande e fiel família.
(CONTINUA)