Enfim liberdade

Mais uma noite só em seu quarto. As lágrimas insistiam em querer cair sobre seu rosto, mas chorar por solidão jamais foi aceitável para ela. Porque logo agora seria diferente? Claro, as circunstancias eram outras. Não era um choro de saudade ou de pura solidão, eram gotas salgadas, temperadas com desesperança e insegurança, algo que não era difícil de encontrar em uma garota como aquela.

Seu pensamento firmado em ser forte e suportar aquilo sozinha fazia com que seus olhos já não ficassem mais tão molhados, mas hora ou outra aqueles sentimentos voltavam e mais uma vez tinha que pensar em ser forte. Quem gosta de garotas choronas e mimadas?

Ela já havia aprendido a ser forte e nunca chorar em público, e nem sozinha quando achava que era desnecessário gastar suas preciosas lágrimas por coisas tão poucas como aquele tipo de sentimento. Guardar tudo para si sempre foi uma boa maneira de se manter bem e fazer com que as pessoas confiassem no que ela dizia. Tantos e tantos anos e ninguém nunca percebera o que realmente se passava em seu coração. Coração não, em sua mente. Romantismo não era o que mais lhe atraía e sempre soube que o coração não pensa, é apenas um músculo involuntário. Nada se passava por lá a não ser seu sangue.

Morrer, para ela, era apenas mais uma etapa da vida, a qual todos que viviam teriam que passar. “Será?” – sim – se pensa, um dia morre. Era assim para ela, nunca chorou por um parente falecer, não ficava triste por um acidente fatal na televisão, ou com assassinatos em série. Tudo era normal, o ser humano sempre foi violento, e a morte acontece. Por esses pensamentos jamais teve medo de se encontrar com seu último dia, último segundo.

O amor? Ah, o amor... Tantos à sua procura e tão poucos o achavam. Não conseguia entender o porque das pessoas terem tanta sede por um sentimento que pode levar ao que tantos temem. Não à morte, mas ao sofrimento em vida. Claro que o amor poderia trazer felicidade, mas também poderia acabar com a vida dessa mesma pessoa, pois ao seu ver, o que constrói pode destruir. “Como as pessoas podem ser tão bobas, estúpidas, para pensarem que só estarão realmente felizes quando amarem?” este era seu pensamento, mas o que ela não sabia era que o amor não poderia ser compreendido jamais, só sabe como é quem já o sentiu.

Sua mente aquela noite estava em órbita, em mundos diferentes, imaginando anos diferentes, anos longe dali onde estava. Como seria sua vida dali alguns anos? E dali muitos anos? Ela seria apenas mais uma velhinha solitária e cética, ou estaria sentada na varanda vendo os netos brincarem junto do avô? Se importaria em pintar os cabelos brancos ou simplesmente deixaria que mostrassem sua idade? O que ela estaria sentindo naquele momento que imaginava tudo aquilo?

Desde que o conhecera, muitas vezes durante a noite, quando se sentia só como agora, um súbito de tristeza e saudade lhe vinham apertar o peito. Aquilo era um misto de tudo que é bom e ruim. Certeza e insegurança. Felicidade e medo. Solidão e esperança. Aconchego e saudade. Apenas alguns dos ingredientes para formar aquele gosto amargo que passava sufocando seu coração e chegava à sua boca para que ela suplicasse por um beijo dele que fazia com que tudo aquilo parasse e recomeçasse de novo quando ele se fosse.

Tais sensações a assustavam de uma forma que chegava a pensar que aquilo era a única coisa que as pessoas deviam temer, nada mais era importante. Só pelo simples fato de querer tanto as mãos dele em seu corpo, ficara com medo de a morte vir lhe visitar e jamais poder experimentar a sensação de uma noite com ele. Será aquela a razão de todos terem tanto medo de partir? Nada mais estava claro para ela. Não tinha mais certeza se o coração não pensava, pois toda vez que o via, mesmo em sonhos, seu coração apertava e no instante seguinte pulsava como se quisesse sair de seu corpo. Não tinha mais certeza sobre a morte, queria viver para sempre ao lado daquele que a fazia tão desacreditada em seus próprios pensamentos.

Não mais por solidão, pois aquele era um motivo inútil, mas por puro amor, as lágrimas que a tanto fazia prisioneiras correram livres pelas colinas de seu rosto, passavam pelo vale em sua boca e caiam.