Poder: que paz queremos conquistar?

Seria a injustiça o preço da paz? Eu gosto de apreciar a beleza do ideal anárquico. Contudo, imagino que, como os seres humanos não são essencialmente iguais, uma sociedade não-hierarquizada provavelmente teria dificuldades enormes em manter um equilíbrio pacífico. Biologismo: não há igualdade social na natureza, sendo, mesmo ela, em muitas situações, totalmente hierárquica.

Não sei se rejeito o poder ou se simplesmente rejeito os abusos de poder. Talvez aí resida a verdadeira injustiça: nos abusos de poder. Não posso ser comunista nem anarquista, embora eu sempre os tenha amado. A minha (nossa) repulsa ao despotismo e à tirania não inclui um ideal social acéfalo, que talvez venha a ser um mero sonho inocente outrora alimentado com combustíveis psicológicos não-renováveis. Só eu sei o quanto aprecio os comunistas, o quanto admiro Karl Marx, e, sobretudo, Che Guevara e todo o engajamento juvenil dos anos 60. Mas não se pode mais ser como Che, pois sabemos hoje de coisas que ele não sabia. Santo Che. Em alguns aspetos, é bem provável que o capitalismo nos tenha cegado, em outros aberto demais nossos olhos, a ponto de fazê-los doer, tamanha a luz a perfurar-nos a retina. Os mesmos tiranos que oprimem, muitas vezes são os mantenedores da paz. Infelizmente, injustiça e paz andam de braços dados. Paz é artigo que muito interessa aos sábios idiotas que estão no poder. Estes, mais do que ninguém, necessitam da ordem. “Ordem” e “Progresso” – nosso velho e conhecido lema positivista – são palavras inconciliáveis. Só a luta faz o mundo progredir. Entretanto, progresso não é, obviamente, um conceito fechado.

A guerra é o estado natural do ser, desde o nível molecular. O que os homens fazem é anestesiar seu estado essencialmente belicoso com o truque, com o artifício da paz. E assim caminhamos.

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