Morte de escritor

Havia se tornado um escritor do meu tempo, mesmo sem que tivesse lido uma linha de sua obra. Os jornais sempre estavam abertos para os seus escritos. Isso causava uma inveja danada. Um ser do Bom Fim em Porto Alegre com todo sentimento que se bebe ali, sendo desse ambiente se sabia fisgado pela irônia alcóolica dos intelectuais de praxe. A pessoa dele estava inteira em sua obra e no seu jeito, nos seus modos. Cronista, romancista , médico. Tudo o que sei dele é que o seu efeito em meu tempo existiu, firme, sincero e impactante. Dobrei certa vez a esquina e nos cumprimentamos como se nos conhecessemos numa cidade com milhões de habitantes. Outra vez lá estava ele no lançamento com Luis Assis Brasil no Centro Municipal de Cultura – ainda sob direção do saudoso Pila Vares. Bem vivo nos lugares públidos onde observamos os ídolos de nosso mundo calado.

Escritor e médico se uniam perfeitamente naquele humanista tranquilo. Com olhos de quem consola meigamente até absurdo e falta de lógica. Seus olhos eram sempre consoladores como o que se destacavam das suas frases claras e tímidas. Enquadramentos perfeitos, dinâmicos e corretos. Pouco dado a antagonismos. Ser que medicava.

É interessante ouvir a palavra de quem se manteve distante do escritor enquanto não leitor.

- Você não gostava dele?

- Claro que não se tratava de gostar ou não gostar...

Estamos entre milhares de livros, você prefere este ou aquele. Fica devendo conhecimento, sempre, Poderia não ter lido Robert Louis Stevenson nas férias, poderia ter sido... Respeitar eu respeitava, ainda que pudesse brincar com ele como se fosse do Casseta e Planeta no lugar comum.

Hoje estou triste. Morreu o escritor que não li, exceto crônicas com facilidade, presente nos jornais, e que falava em viver, viver melhor, Sem conhecer ainda ficou em mim o homem simples que responderia com delicadeza e educação qualquer pergunta que eu fizesse por onde ele andasse. Humorado e com uma pincelada de solidão no retrato, tenho certeza de que deixou em seus livros uma grande mensagem. Mensagem que devo procurar agora na alma das livrarias.

Ele surgirá da solidão daqueles que escrevem. Direi aos meus filhos: não tive oportunidade de conhecê-lo. Colorindo na solidão das ausências significado próprio ao homem que escreve.

Tércio Ricardo Kneip
Enviado por Tércio Ricardo Kneip em 28/02/2011
Código do texto: T2819702
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.