Tristeza infinita.
 
Casada a mais de vinte anos, mãe de dois filhos, uma menina de oito anos e um menino de dez, ela não esperava ter mais filhos.
Quando engravidou novamente, foi uma festa, a família toda vibrou com a notícia, os irmãos esperavam ansiosamente a chegada do bebê, e escolheram o nome:
Luiz Renato(Luiz=lutador e Renato=renascido)
Luiz foi uma homenagem ao irmão que tem o mesmo nome e Renato a escolha da irmã.
A gravidez foi tranqüila, acompanhada passo a passo pelas crianças e pelo pai.
Finalmente chegou o grande dia.
Foi necessário cirurgia, o bebê nasceu com uma marquinha pequena e vermelha na testa.
A mãe passou mal,  foi difícil fazê-la voltar à vida.
A criança era loirinha, careca, sobrancelhas e cílios quase brancos, era forte e saudável. Os dois irmãos se consideravam os pais do pequeno, tinham o maior orgulho dele, lhe dedicavam muito carinho, faziam todas as suas vontades, davam-lhe muitos presentes e atenção.
Ele cresceu um menino inteligente, mas fujão, sempre colocava a vizinhança à sua procura.
Gostava muito de animais. Certa vez criou girinos dentro de um vaso de vidro em cima da pia do banheiro. Tinha um gato que amava, mas o coitado era colocado dentro da mochila, e com ele assim andava de bicicleta a tarde toda!Seu cachorro vira- latas sentava-se sob sua carteira na escola, ninguém conseguia tirar o bicho de lá, nem ele mesmo, no recreio o bichinho brincava com as crianças, elas se acostumaram com a presença dele!
Montava a cavalo muito bem, saltava obstáculos, na Hípica ganhou vários prêmios. Sofreu várias quedas, algumas de gelar o sangue...
Quando adolescente, tocava guitarra, tinha uma banda e se apresentava em shows, com os amigos que o acompanhavam desde a infância.
Se tornou um rapaz muito bonito.
Experimentou todos os esportes possíveis, apenas o dominasse, mudava para outra modalidade, dirigia moto a toda velocidade, nunca soube o que era medo!Arriscava a vida a cada minuto!
Muito alegre, gostava de colocar apelido em todos,inclusive chamava a mãe de “roxinho”,de “pi doirado” e mais uma meia dúzia de nomes carinhosos.
Uma criatura diferente, levantava de madrugada para ver o amanhcer na serra ou no campo... Dizia ser a coisa mais linda do mundo ver o sol nascer, a grama molhada de sereno e os passarinhos acordando felizes...
Adulto, fazia faculdade e ficou noivo.
Carinhoso, romântico, amoroso, expunha claramente seus sentimentos, tanto de amor quanto de raiva.
Algumas vezes chegava em casa com olho roxo, porque segundo ele não aceitava desaforo e nem gente folgada...
Preocupava demais os pais e irmãos, todos lhe dedicavam um amor imenso e temiam pela sua vida, pelos riscos a que se submetia.
Sua filosofia era que preferia viver pouco e intensamente a viver cem anos sem ter feito nada!
Foi exatamente o que fez, parece que estava adivinhando o futuro...
Como casaria em breve, se mudou para o futuro apartamento, decorado a seu gosto com objetos que lembrassem a Itália, País de sua paixão.
Pois bem, a tragédia veio de mansinho através do gás expelido pelo aquecedor de banheiro em seu apartamento...
A chamada “morte branca”, comum na cidade na época do inverno.
Que ironia, morrer assim, depois de se arriscar tanto...
A mãe o encontrou embaixo do chuveiro já sem vida, quase enlouqueceu, uma crise de desespero por muito pouco não a levou com ele.
O pai desconsolado lutava contra a dor da perda.
Foi o dia do juízo final para todos.
Os irmãos transtornados de dor pela perda do “filho”, não se conformavam, tanto física como emocionalmente abalados tiveram a saúde gravemente afetada.
O único sobrinho ainda criança sofreu muito com a perda do seu tio Toto, eles se amavam.
Todos se revoltaram com sua perda, até hoje não se recuperaram, não o esquecem, tudo é motivo para trazê-lo a lembrança.
O fato ocorreu a doze anos, mas a dor continua...
Um pouco mais suave, mas latente...
A morte abalou a família que ainda hoje luta para recuperar um pouco da alegria que se foi com ele.
A mãe sempre teve o pressentimento que não o teria muito tempo com ela nesta terra...
Ficou mais conformada quando depois de dez anos, certa noite ele veio visitá-la, passou as mãos em seus cabelos e disse:
“-Não se preocupe roxinho, tudo correrá bem.”
E se afastou sorrindo...
Ela chorou e rezou o resto da noite, feliz, mas com o coração despedaçado pela emoção e pela saudade...
Ela espera que um dia tenha novamente a graça de vê-lo ainda mais uma vez, antes do encontro final...
Profundamente emocionada, só contou o fato ao pai dele, aos outros filhos e ao neto depois de vários dias...
A verdade e o consolo vieram através das palavras de seu neto que a abraçando, disse uma verdade incontestável :
-Vó, por que você fica assim, não chora, o tio Toto, nunca saiu daqui... Ele está dentro da gente!
È verdade...
Como ele tem razão!
Mas as lágrimas continuam queimando minha pele e minha alma!
Sim , essa pessoa sou eu!

 
M.H.P.M.