O chapéu cearense
de Napoleão Bonaparte
As crônicas de Deonísio da Silva são simplesmente maravilhosas! Peraí: não somente suas crônicas são fantásticas; é fantástico tudo o que ele escreve: seus contos, seus romances.
Um de seus romances pede a atenção de quem curte uma boa leitura: Tereza D´Ávila: namorada de Jesus.
Deonísio tem uma escancarada devoção por essa monja carmelita, nascida na cidade espanhola de Ávila, no dia 28 de março de 1515.
Mulher culta, Doutora da Igreja, Santa Tereza de Ávila morreu no dia 4 de outubro de 1582.
*** *** ***
Quando dúvidas me assaltam sobre a origem desse ou daquele vocábulo, vou buscar explicações no livro A vida íntima das palavras, do Deonísio.
Exemplifico, trazendo para o leitor o que esse bom escritor escreve sobre a intimidade de duas palavras: o beijo e o ósculo.
"Beijo: do latim basium , beijo. Outras líguas neolatinas, como o italiano e o espanhol, grafam baccio e beso, respetivamente. E uma curiosidade japonesa marca este vocábulo, uma vez que os nipônicos referem-se ao beijo como kissu, do inglês kiss. "
E prossegue: "É célebre a passagem dos Evangelhos em que Judas Iscariotes usa o beijo como sinal de identificação para trair Jesus Cristo por 30 dinheiros: "aquele a quem eu der um beijo na face, é ele; prendei-o".
"O escritor Ignácio de Loyola Brandão - continua - é autor de um romance com o título O beijo não vem da boca. O poeta parnasiano Olavo Bilac, apesar de ter inventado o livro didático, compôs belíssimas poesias em que celebra o amor arrebatado e sensual.
Foi eleito em vida o príncipe dos poetas brasileiros e são seus esses versos: "Quero um beijo sem fim,/ Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!,/ Ferve-me o sangue, acalma-o com teu beijo,/ Beija-me assim!/ O ouvido fecha ao rumor/ Do mundo, e beija-me, querida!/ Vive só para mim, só para a minha vida/ Só para o meu amor!"
E finaliza: "Outros foram mais prosaicos ao falar de beijos, como Ramón Gómez de la Serna: "ás vezes o beijo não passa de um chiclete partilhado".
"Ósculo: do latim osculum, boquinha. Designa o beijo pela forma que tomam os lábios ao serem contraídos, tornando a boca mais arredondada.
O beijo pode não ser casto, aliás, raramente o é, mas o ósculo é pudico porque exclui a língua e não faz sucção, livrando-nos por conseguinte de certos desconfortos do carinho público, quando casais indiscretos nos obrigam a ouvir ruídos de desentupidores de pia, acompanhados de trilhas sonoras que semelham o barulho de locomotivas prestes a partir.
Mas como a temperança parece ser a grande medida das coisas amorosas, é bonito o beijo dos amados em praça pública..."
Notem e anotem a diferença, diria sutil, entre o ósculo e o beijo, e faça a sua opção.
*** *** ***
A erudição do Deonísio está presente em todos os seus textos. E dessa erudição ele lança mão para dirimir dúvidas, corrigir erros, esclarecer equívocos, e divertir.
Do seu livro de crônicas A Placenta e o caixão, recolhi, por exemplo, que o romano antigo Décimo Júnio Juvenal é o autor da conhecida e muito citada expressão "pão e circo".
Décimo escreveu que o povo queria, apenas, panem et circenses - pão e palhaços. Como na velha Roma, também hoje.
Que Suetônio registrou a desistência de Catão, escalado para apaziguar um tumulto originado pela fome, com esta frase: "É muito difícil explicar alguma coisa ao estômago, que não tem ouvidos". Ou, em latim: Per difficile est verba facere ad ventrem auribus carentem. Mais bonito.
Transcreve, em uma de suas crônicas, estes belos versinhos do querido escritor alagoano Lêdo Ivo: "Na escola primária/ Ivo viu a uva/ e aprendeu a ler./ Ao ficar rapaz/ Ivo viu a Eva/ e aprendeu a amar".
"Navegar é preciso, viver não é preciso" - Lembra Deonísio que estas frases não são nem do Caetano, nem do Chico Buarque e nem do Fernando Pessoas, como querem alguns.
E assegura: "Quem as tornou famosas, foi o general romano Pompeu, persuadindo marinheiros a zarpar com os navios carregados de alimentos, mesmo em meio a uma tempestade, porque havia muita fome em Roma."
Em outra crônica, sobre o nascimento de Jesus, diz Deonísio: "Jesus não nasceu no primeiro ano de nossa era.
Paradoxalmente, seu nascimento deu-se por volta do ano 5 a.C." E registra o que motivou o equivoco, assim: "...aos atrapalhos de um momge chamado Dionísio, o Pequeno, péssimo em matemática, que em 525 errou os cálculos de um novo calendário e indicou o nascimento de Cristo no ano 1".
O bordão Roma locuta, causa finita, que, em outras palavras quer dizer assunto encerrado, lembra Deonísio que ele foi tirado de um dos sermões de Santo Agostinho. Pouca gente, creio, creditaria ao Bispo de Hipona a autoria desta frase, apesar da popularidade que ela adquiriu.
Por último, um fato curioso que a maioria dos cearenses - eu inclusive - com certeza desconhece: noutra crônica, Deonísio diz que "O Ceará esteve presente na Batalha de Waterloo!" Como? Ele esclarece, garantindo que na célebre refrega, "Napoleão usava um chapéu de couro, presente de um coronel do sertão cearense".
OH! como eu gostaria de saber como isso aconteceu! Socorram-me os historiadores!
Eu poderia - e vontade não me falta - gastar laudas e mais laudas transcrevendo o que de interessante vi no livro de crônica do Deonisio aqui citado.
Mas terminaria cansando o amigo e a amiga que ja sofre em ter que me tolerar, lendo-me; ainda que por acaso;
Que este meu esforço em divulgar a obra do Deonísio da Silva leve meus leitores pelo menos às divertidas e sábias páginas de A Placenta e o caixão, fonte inspiradora destes inexpressivos rabiscos, digitados tarde da noite.
de Napoleão Bonaparte
As crônicas de Deonísio da Silva são simplesmente maravilhosas! Peraí: não somente suas crônicas são fantásticas; é fantástico tudo o que ele escreve: seus contos, seus romances.
Um de seus romances pede a atenção de quem curte uma boa leitura: Tereza D´Ávila: namorada de Jesus.
Deonísio tem uma escancarada devoção por essa monja carmelita, nascida na cidade espanhola de Ávila, no dia 28 de março de 1515.
Mulher culta, Doutora da Igreja, Santa Tereza de Ávila morreu no dia 4 de outubro de 1582.
*** *** ***
Quando dúvidas me assaltam sobre a origem desse ou daquele vocábulo, vou buscar explicações no livro A vida íntima das palavras, do Deonísio.
Exemplifico, trazendo para o leitor o que esse bom escritor escreve sobre a intimidade de duas palavras: o beijo e o ósculo.
"Beijo: do latim basium , beijo. Outras líguas neolatinas, como o italiano e o espanhol, grafam baccio e beso, respetivamente. E uma curiosidade japonesa marca este vocábulo, uma vez que os nipônicos referem-se ao beijo como kissu, do inglês kiss. "
E prossegue: "É célebre a passagem dos Evangelhos em que Judas Iscariotes usa o beijo como sinal de identificação para trair Jesus Cristo por 30 dinheiros: "aquele a quem eu der um beijo na face, é ele; prendei-o".
"O escritor Ignácio de Loyola Brandão - continua - é autor de um romance com o título O beijo não vem da boca. O poeta parnasiano Olavo Bilac, apesar de ter inventado o livro didático, compôs belíssimas poesias em que celebra o amor arrebatado e sensual.
Foi eleito em vida o príncipe dos poetas brasileiros e são seus esses versos: "Quero um beijo sem fim,/ Que dure a vida inteira e aplaque o meu desejo!,/ Ferve-me o sangue, acalma-o com teu beijo,/ Beija-me assim!/ O ouvido fecha ao rumor/ Do mundo, e beija-me, querida!/ Vive só para mim, só para a minha vida/ Só para o meu amor!"
E finaliza: "Outros foram mais prosaicos ao falar de beijos, como Ramón Gómez de la Serna: "ás vezes o beijo não passa de um chiclete partilhado".
"Ósculo: do latim osculum, boquinha. Designa o beijo pela forma que tomam os lábios ao serem contraídos, tornando a boca mais arredondada.
O beijo pode não ser casto, aliás, raramente o é, mas o ósculo é pudico porque exclui a língua e não faz sucção, livrando-nos por conseguinte de certos desconfortos do carinho público, quando casais indiscretos nos obrigam a ouvir ruídos de desentupidores de pia, acompanhados de trilhas sonoras que semelham o barulho de locomotivas prestes a partir.
Mas como a temperança parece ser a grande medida das coisas amorosas, é bonito o beijo dos amados em praça pública..."
Notem e anotem a diferença, diria sutil, entre o ósculo e o beijo, e faça a sua opção.
*** *** ***
A erudição do Deonísio está presente em todos os seus textos. E dessa erudição ele lança mão para dirimir dúvidas, corrigir erros, esclarecer equívocos, e divertir.
Do seu livro de crônicas A Placenta e o caixão, recolhi, por exemplo, que o romano antigo Décimo Júnio Juvenal é o autor da conhecida e muito citada expressão "pão e circo".
Décimo escreveu que o povo queria, apenas, panem et circenses - pão e palhaços. Como na velha Roma, também hoje.
Que Suetônio registrou a desistência de Catão, escalado para apaziguar um tumulto originado pela fome, com esta frase: "É muito difícil explicar alguma coisa ao estômago, que não tem ouvidos". Ou, em latim: Per difficile est verba facere ad ventrem auribus carentem. Mais bonito.
Transcreve, em uma de suas crônicas, estes belos versinhos do querido escritor alagoano Lêdo Ivo: "Na escola primária/ Ivo viu a uva/ e aprendeu a ler./ Ao ficar rapaz/ Ivo viu a Eva/ e aprendeu a amar".
"Navegar é preciso, viver não é preciso" - Lembra Deonísio que estas frases não são nem do Caetano, nem do Chico Buarque e nem do Fernando Pessoas, como querem alguns.
E assegura: "Quem as tornou famosas, foi o general romano Pompeu, persuadindo marinheiros a zarpar com os navios carregados de alimentos, mesmo em meio a uma tempestade, porque havia muita fome em Roma."
Em outra crônica, sobre o nascimento de Jesus, diz Deonísio: "Jesus não nasceu no primeiro ano de nossa era.
Paradoxalmente, seu nascimento deu-se por volta do ano 5 a.C." E registra o que motivou o equivoco, assim: "...aos atrapalhos de um momge chamado Dionísio, o Pequeno, péssimo em matemática, que em 525 errou os cálculos de um novo calendário e indicou o nascimento de Cristo no ano 1".
O bordão Roma locuta, causa finita, que, em outras palavras quer dizer assunto encerrado, lembra Deonísio que ele foi tirado de um dos sermões de Santo Agostinho. Pouca gente, creio, creditaria ao Bispo de Hipona a autoria desta frase, apesar da popularidade que ela adquiriu.
Por último, um fato curioso que a maioria dos cearenses - eu inclusive - com certeza desconhece: noutra crônica, Deonísio diz que "O Ceará esteve presente na Batalha de Waterloo!" Como? Ele esclarece, garantindo que na célebre refrega, "Napoleão usava um chapéu de couro, presente de um coronel do sertão cearense".
OH! como eu gostaria de saber como isso aconteceu! Socorram-me os historiadores!
Eu poderia - e vontade não me falta - gastar laudas e mais laudas transcrevendo o que de interessante vi no livro de crônica do Deonisio aqui citado.
Mas terminaria cansando o amigo e a amiga que ja sofre em ter que me tolerar, lendo-me; ainda que por acaso;
Que este meu esforço em divulgar a obra do Deonísio da Silva leve meus leitores pelo menos às divertidas e sábias páginas de A Placenta e o caixão, fonte inspiradora destes inexpressivos rabiscos, digitados tarde da noite.