MÃOS INVISÍVEIS
Era um dia comum, tarde quente, sol brilhando e deixando o céu de um azul quase que anil. Já fazia algum tempo que, a menina chegara da escola, almoçara com a família reunida, pois na vila todos vinham comer em casa no almoço. Agora tinha que esperar para a digestão ser feita, sua avó sempre repetia, como se fosse um mantra: "depois de comer, não se vai na água, da congestão e isso mata." Ela nem sabia o que vinha a ser "congestão", nos seus sete anos de idade, essa palavra soava enfadonha, pois a fazia perder duas horas de folguedos no lago em frente a sua casa.
Ai que tortura, ao longe ouvia o barulho dos amigos a pular nas águas frescas do lago, e o relógio da cozinha, um despertador que ficava em cima do guarda-comida, justo hoje, estava com preguiça de andar. Todos já haviam voltado para o trabalho, sua mãe, seu pai, seu avô e seu tio, na cozinha somente ela que não descuidava do despertador, com medo dele parar de vez, e sua avó, ocupada com a montanha de louça que restara do almoço. O fogão a lenha, ainda guardava o calor do fogo, com que se servira para o preparo da refeição. Finalmente, eis que os ponteiros resolveram se movimentar, e lá foi a menina para as brincadeiras na água, mas, não sem antes pegar sua bóia, feita de uma câmera de pneu velho. Fazia apenas alguns minutos que alegre ela brincava, junto aos amigos nas águas do lago, quando por descuido, a bóia lhe escapou, e ela afundou. Aflita se debatia, já nesse desespero estava a afundar pela terceira vez, quando sentiu mãos invisíveis lhe trazerem a tona. Foi nessa hora que um primo mais velho, que sabia nadar, a resgatou e a trouxe a salvo para a margem do lago.
Naquela noite, em sua casa foi rezado um terço, e um maço de velas sua avó acendeu em gratidão ao seu anjo de guarda. A menina que por algumas horas esteve assustada, agora se regalava, por ser o centro das atenções. Na vila pacata, o acontecido da tarde, dava pano pra manga, e todos queriam ouvir dela, como eram as mãos invisiveis que a socorreram, ao qual ela simplesmente respondia: "ué, mas se as mãos eram invisíveis, e não as vi, como posso dizer como eram?"