Centro de Fortaleza

O Centro anoitecia naquela pálida tarde que faceira e entre buzinas irracíveis escapava. Comerciantes fechavam suas portas, clientes insistentes arriscavam a última pechincha e a classe proletária apinhada nos coletivos descia com rostos cansados ruma à periferia daquela iluminada cidade, Fortaleza! Ruas estreitas engarrafavam, Avenidas tão estreitas quanto engarrafavam da mesma forma e onde quer que se desejasse ir, não se ia, pelo menos não naquela hora. Rumo a área nobre de Fortaleza não se ia, o que dizer então dos vagarosos ônibos levando o trabalhador ao descanso do seu tão sagrado lar? À perifia, portanto, também, com certeza, não se ia, pelo menos não naquela hora. Mas a cidade como um todo, essa mesma não parava, fervia, melhor: fervilhava! Mendigos reservavam o lugar do sono construindo suas camas e estacionando perto da moradia os catados do dia, meninos e meninas de rua deixavam de lado por alguns instantes a cola, ou levavam assim mesmo (os mais aficionados) para aproveitar o rítmo lento do trânsito e pedir esmolas, motos passavam, pedestres passavam, só os carros é que, por ali, naquelas malditas vias estreitas, não passavam. Assim era o Centro de Fortaleza, essa loira meretriz de cabelos esvoaçantes, preparando seus encantos para a noite que iniciava. Bares antigos— cantos sujos, pinga velha, banco roto— recebiam seus primeiros clientes da noite. Travestis e prostitutas, dos tais clientes, dividiam os olhares e a atenção: numa esquina os travestis, noutras as prostitutas, com uma certa distância, é claro, mas acho que nunca houve problemas, devem ter o mesmo cafetão! Carros e coletivos passavam âs graças:

— gostosa!

— Peituda!

— Ê lá em casa…

Elas e eles (os travestis) sorriam discretamente, não por pudor é claro, mas por costume e por sempre ouvirem as mesmas buzinas, as mesmas cantadas e as mesmas graças já estavam imunes a qualquer acesso de vaidade. Eram apenas profissionais entre os tantos que, naquela noite que iniciava, se iam ou vinham ao Centro do Fortaleza.

italopirez
Enviado por italopirez em 13/02/2011
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