FUI VICIADA

Por dez anos fui fumante, como a maioria das garotas mais velhas da minha época. A motivação era uma só: glamour e charme; havia a tentativa de se afirmar em um meio em que prevalecia a quebra de regra. Meus pais não fumavam e nem admitiam que os filhos homens fumassem, imagine a única filha! Creio que desconfiavam que os três filhos tinham se transformado em "caiporas". O fumar escondido era desafiante. Fumava, no começo, o "se me dão", depois fui bancando o meu vício e era de tudo, Charme, Continental, Astória ((era forte de matar) e, minha preferência era pelo Holyhood, talvez por achar bonito as artistas de cinema fumarem ou sonhar em ser uma. Nenhum vício é inocente, mas o que importava? Depois que aprendi a tragar, achava prazeroso. Não havia campanhas falando dos males, pelo menos que me lembre. Aliás, só me lembro das belas propagandas que, ainda bem, sumiram .

Depois do vício estabelecido, não havia como me questionar porque continuava fumando e como estava meu ânimo para acender o cigarro; às vezes acendia um no outro, dependendo de onde estivesse e como estava me sentindo. Lembro que numa república de estudantes, em Recife, onde eu morava com mais cinco alagoanas, duas fumavam e as outras reclamavam do cheiro. O vício torna você egoísta, pois se não tinha como resistir, as outras que aguentassem. O pior deste vício é ser socialmente aprovado, fumando-se em quase todos os lugares. Minha amiga Marize disse-me que deixou por conta de seus pacientes sentirem o cheiro já que, sendo dermatologista, tinha que se aproximar muito do que vai examinar e, por vergonha do odor, deixou. A outra, Nininha, descobriu que estava grávida porque não conseguia acender o cigarro. Enjoou para a vida toda. Nunca enjoei, mas decidi, às vésperas do casamento, deixar o vício. Fui morar no Rio de Janeiro e lembro do sofrimento físico e psíquico que passei. Deixei de forma abrupta e a síndrome de abstinência se instalou. È possível que tenha tido algumas perturbações, como irritação, choro fácil, ansiedade. Começo de vida casada, terra estranha,fazendo Mestrado com jovens de todo o país, as carteiras de cigarro passando por minha banca de estudo, não foi nada fácil. Um propósito me acompanhou: jamais acender um cigarro, porque certamente eu voltaria a fumar. O cheiro hoje me incomoda provando, mais uma vez, que mudamos. Tenho três filhos e nenhum experimentou e se viciou.

Leio como andam as pesquisas sobre como deixar de fumar. Precisa-se primeiro o querer, depois tem que ter um acompanhamento como uso de medicação e também uma assistência psicológica. As mulheres são menos resistentes ao uso de medicamentos, já os homens têm menos motivos comportamentais. Não é que não necessitem de ajuda psicológica, mas suas motivações dizem menos respeito ao lado emocional. Para os homens os danos são menos devastadores do que para as mulheres, pois o câncer de colo de útero, problemas circulatórios e outros possibilitam o aparecimento de osteoporose, sem falar em ataques cardíacos, derrames; a pele e o cabelo também revelam os danos internos. Descobri com os anos, mas só depois de deixar de fumar, que o cigarro vicia do mesmo modo que a cocaína e a heroína. Como se traga aos poucos, o organismo vai enfraquecendo lentamente. Feliz de quem se liberta dele e eu, mesmo relembrando o sofrimento que passei, já estou há muitos anos "limpa". Sou ex viciada; ganhei em anos e mais qualidade de vida.

Edméa
Enviado por Edméa em 13/02/2011
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