O brasileiro Raphael de Almeida Magalhães
Os bons amigos que me dão a honra de ler algumas das minhas crônicas, nem sempre com muito capricho na procura das melhores palavras, nem da melhor sintaxe, mas que exprimem naquele momento em que as faço o que estou verdadeiramente sentindo, devem ter notado que, ultimamente, andei explodindo de amor pelo Brasil e pelos brasileiros.
Não só isso, o que para muitos poderia parecer um ufanismo ingênuo, não só o carinho pelo nosso Brasil, mas também fui inundado e engolfado por ondas enormes de um sentimento de libertação de preconceitos, de tolas crenças que acabam nos encarcerando mentalmente.
Infelizmente, porém, faltou-me talento para ir mais fundo neste sentimento oceânico, que inclui toda a humanidade, e atingir o coração das pessoas. Diria que não consegui “firmar o ponto”, o meu “caboclo” não chegou a cantar a música daqueles que, em vida, entoaram os acordes da vida plena, da felicidade tão procurada e nunca encontrada por nós, simples mortais.
Num desses sincronismos da vida, tomo conhecimento da morte de um grande brasileiro, Raphael de Almeida Magalhães , com 80 anos de idade. Este homem, só agora fico ciente, soube tocar com maestria esses acordes harmônicos que mencionei acima.
Vi, ainda bem moço, Raphael Magalhães ser Vice-Governador do antigo Estado da Guanabara, no governo Carlos Lacerda, e depois Deputado Federal. Daí pra frente não soube mais dele. Sabia que era um homem afável, inteligente, de excelente caráter. Mas o perdi de vista.
Agora, em fevereiro de 2011, em sincronicidade com meus sentimentos atuais, lendo os jornais, tenho o retrato de corpo inteiro desse homem, através das belas palavras de sua neta Flora , em seu depoimento sobre o avô, na missa rezada em sua memória. Em certo trecho, diz ela: “ Meu avô era um desses raríssimos homens que não se deixava abater pelos percalços da vida. Costumava dizer que era preciso procurar uma brecha de felicidade mesmo nas situações mais difíceis; e que esta, quando encontrada, nos servisse de guia para enfrentar as dificuldades”. Mais adiante no seu discurso, prossegue: “Eu agradeço todos os dias por ter tido a oportunidade de conviver com um homem tão grandioso que me fazia relembrar, todas as vezes em que nos encontrávamos, que o mundo valia a pena e que a humanidade, apesar de toda nossa falta de jeito, é o maior milagre da natureza”. E quase ao fim de sua fala, nos diz: “É preciso viver intensamente; é preciso acreditar nos nossos ideais, lutar por eles mesmo que depois mudemos de ideia; é preciso conhecer o outro, respeitar suas ideias mesmo que elas sejam completamente diferentes das nossas, a gente sempre aprende com os outros, sempre; é preciso fazer as coisas com prazer, o sucesso e o fracasso são só consequências (........) Isto eu aprendi com meu avô.”
Filho do deputado federal por Minas Gerais Dario de Almeida Magalhães, ele nasceu em Belo Horizonte, em 1930, mas foi radicado no Rio, onde estudou no Colégio Santo Inácio e na Pontifícia Universidade Católica, onde se formou em Direito. Foi no Rio que iniciou sua carreira política.
Segundo seu genro, o cineasta Cacá Diegues, Raphael de Almeida Magalhães foi um orador de grande sedução, fino articulista, fanático pela tolerância e pelo entendimento, um dos grandes articuladores das campanhas das Diretas e da Anistia.
Não poderia deixar de divulgar tão belo retrato e fico profundamente agradecido à neta de Raphael Magalhães, nos mostrando quem foi esse mineiro-carioca, que no futebol de areia, em Copacabana, era o artilheiro do Ouro Preto do Lido.
O que a jovem neta de Raphael testemunhou era o que eu queria ter dito nas minha crônicas “Os meus abolicionistas” e “Meu Brasil brasileiro”.
Em resumo, contra esse pano de fundo de misérias e tristezas, existem, sim, pessoas maravilhosas e a humanidade avança para melhor, apesar da nossa falta de jeito e do nosso canto ainda desafinado.