"Amor Virtual"
Era só uma espiadinha, nada mais. Recebeu o convite de um ex aluno que a muito tempo não via. Afinal, são tantos "sites" de relacionamentos, "orkut", "sonico", "facebook", que um a mais não faria diferença. Mas fez. "Baddo" era o nome do "site" que para ser integrante era necessário construir um perfil e obrigatoriamente postar uma foto sua para que se efetivasse. Mal colocou sua foto e como que num passe de mágicas, em pouquíssimos segundos, uma dezena de pessoas dizia estar interessada em alguém como ela. Enviavam recados que piscavam em pequenos balôezinhos o tempo todo. Sentiu-se lisonjeada por alguns instantes e nem sequer conseguia raciocinar direito, entre uma resposta e outra, pois precisava ser ágil. Foi quando percebeu que não daria conta de ser gentil com todos os interessados de plantão, porque só estava ali a uma hora aproximadamente e o número de admiradores já havia se multiplicado.
E assim prosseguiu pelos próximos dias, alimentando seu "ego' e surpreendendo-se com alguns de seus novos visitantes. Não conseguia entender como poderiam estar interessados em apenas uma foto sua e meia dúzia de palavras a seu respeito, que nem precisavam ser verídicas. E quantos não omitiam verdades sobre si mesmos. Sim, porque lá era possível criar uma imagem baseada naquilo em que se gostaria de ser e não o que realmente se era. Não era o seu caso, mas o de muitos provavelmente. Não mentira a respeito de si mesma, no entanto, suas respostas davam vasão a várias interpretações.
Deletou seu perfil algumas vezes, entretanto, toda vez que abria seus "e-mails", lá estava a lista de novos pretendentes, esperando por um retorno seu, e o pior, para saber o que diziam a seu respeito era necessário refazer o perfil. A curiosidade era forte e sempre a vencia, ainda mais que entre os visitantes havia um que estava sempre presente. Não mandava recados, de poucas palavras, mas estava sempre lá. Insistentemente. O que a instigava ainda mais. Sentia-se observada por ele todos os dias. Por que a observava tanto? Passou a observá-lo também. Por que não deixava nenhum recado? Já a conhecia, talvez. Mas de onde? Não, impossível.
Foi então que resolveu falar. Trocaram algumas informações entre si e meio a perguntas e respostas ela se incomodava com outros intrusos batento a sua porta. Era melhor sair dali e entrar em outra sala de bate papo, um pouco mais tranquila, onde pudessem dar exclusividade um ao outro. E assim se fez. Ufa! Era como se tivessem saido de uma grande festa onde mal conseguiam se ouvir e aos poucos se afastavam, ficando cada vez mais sozinhos. Msn. Hehehe. Souberam mais sobre seus gostos, suas preferências, suas opiniões, particularidades, enfim...Compartilharam fotos e deram boas risadas juntos. Marcaram novos encontros e se de repente por algum motivo um não podia comparecer o outro cobrava sem nenhuma restrição. Com a mesma agilidade já vivenciada anteriormente, assim aumentava a intimidade entre eles. Era como se ela já o conhecesse a muito tempo. Começou a fazer parte dos seus dias, por vezes de suas noites, quando perdia o sono pensando em tudo o que haviam compartilhado. A cada dia queria saber mais sobre aquele ser idealizado. Procurava conhecê-lo através das características apontadas pelo zodíaco. Ele, sujeito harmonioso, sentimental. Ela, inconstante, imprevisível, mas carente também. Gremista. Ele, colorado. Poderia ser o fim, mas mesmo com tantas diferenças evidenciadas, e fora os segredos ainda não revelados de cada um, havia algo que os mantinham ligados.
E rotineiramente estavam lá, se dando "bom dia meu anjo", perguntando "como foi o seu dia?", "boa noite querido", abraços e beijos e declarações do tipo "nossa, que saudade de você". É, sem que se dessem por conta, já estavam mais do que comprometidos um com o outro. Até cenas de ciúmes já rolavam. E com o tempo, algumas brigas (mas quando faziam as pazes é que era muito bom), desconfianças, cobranças. E foi dele a decisão de querer vê-la pessoalmente. "Assim não dava mais". Foi o que ele disse. Um súbito pavor tomou conta dos pensamentos dela. Quantos casais já se deram por conta que não sabiam nada um sobre o outro? Quantas relações duradouras findaram porque os envolvidos perceberam que não se reconheciam mais? E se não se reconhecessem? Da maneira como estavam acostumados a se ver. Ela sabia. Com certeza seria o fim. O rompimento de algo que a muito ela não sentia. Companheirismo, atenção, carinho...amizade...amor quem sabe...mesmo que virtual.