O PERFIL, O CRUCIFIXO E A UTOPIA

Quando comecei a escrever pra valer, no fim dos anos 50 dos 1900, foi com extrema dificuldade física numa Hunderwood preta, cor que hoje os engraçadíssimos vendedores de um canal de TV chamam de black piano. Pela hóstia! A dificuldade física era por conta da penosa utilização de apenas dois dedos de cada mão, já que os virtuoses teclavam com os dez dedos; eram os Rubinsteins da datilografia. Naquela época havia cursos que ensinavam datilografar com rapidez e precisão. Eram muitos pela cidade assim como eram muitos os cursos de violão, acordeão, caligrafia, bordado, costura... ; bons tempos ingênuos aqueles.

Passaram-se os anos e passei para uma Remington no Departamento de Jornalismo da Rádio Guaíba onde me encantava com o feroz bate teclas do telegrafista a receber notícias da sucursal da Caldas Júnior no Rio de Janeiro a capital do Brasil naquela época.

Foram-se os anos, foram-se a Underwood e a Remington e chegou a Olivetti Lettera 22; o paraíso em forma de máquina datilográfica – como eram chamadas as máquinas de escrever - e a glória e a doçura de todos os teclados. E depois vieram outras máquinas e outras redações até a chegada do computador desktop. Não poderíamos imaginar, eu e as máquinas de escrever, que tudo isso que estou agora escrevendo acontece quando mal encosto a ponta dos dedos em teclas sensíveis, semi-inteligentes, deste teclado Multilaser de onde comando tudo; escrever, ler, ouvir, ver, mandar, receber mundo a fora, numa única máquina.

Pois sou daquele tempo em que perfil significava, além do contorno de um rosto ou de um objeto, um qualificativo breve descrevendo as características de alguém. Assim, audaz, inteligente, burro, medroso, era o perfil de alguém, uma qualidade ou deficiência, para exercer determinado cargo ou uma boa pista para a polícia encontrar um criminoso.

As maquinas de datilografia mudaram o jeito de escrever, pois não havia mais a necessidade de se ter uma boa caligrafia para se fazer entender, para trabalhar num cartório ou realizar a escrita de uma firma. Ter uma boa letra não era mais tão necessário assim. Uma condição que apenas os médicos estavam, e até hoje estão, desobrigados, já que ninguém entende o que escrevem nos receituários.

Com a internet, a palavra perfil ganhou outro significado nesse meio de comunicação. Hora é currículo, hora trata das preferências pessoais do indivíduo. Nos blogs e sites de relacionamento há jóias como “sou aquela que não é...”. Fico pensando quem será aquela que não é embora ela diga que seja? Nos blogs de poesias é comum “sou sensível com uma flor, mas suporto uma dor que seja de amor”. Impossível saber de quem se trata com um perfil desses. Outro dia li um perfil que poderia ser uma mensagem secreta: “Sou assim, mas nem por isso sei quem sou. Gosto mais do gosto do que do desgosto, do cheiro do que do aroma, do talvez mais do que do quem sabe. Já fui, mas nem cheguei perto. Procure, quem sabe onde estou?”

Intrigado, procurei estabelecer perfis para pessoas, empresas, cidades e até países com essa formula de revelação. Para uma fábrica de sorvetes poderia ser “o que produzimos é cremoso, colorido e gelado como o coração de um torturador.” Uma cidade talvez pudesse se revelar com esse perfil: “A chuva nos alaga porque estamos sempre de portas abertas esperando você. Bem vindo a Lake City” Um país, digamos da America do sul, poderia ser identificado assim: “Hay que endurecerse pero sin perder la textura”.

E nós quem somos? Qual será o perfil do brasileiro? Vasculhei em Roberto da Mata, em Florestan Fernandes, em Gilberto Freire e não fiquei satisfeito; por arrogância ou atrevimento, não fiquei satisfeito. O velho udenista pernambucano que apoiou o golpe militar que derrubou João Goulart, não me inspira nada; mesmo que Monteiro Lobato, que me ensinou a ler e a supor saber escrever, tenha afirmado que o Brasil do futuro será o que Gilberto Freire disser e não o que disserem os velhos historiadores. Perdido e intrigado tenho procurado, por anos a fio, traçar o meu perfil brasileiro. Quem sou eu, eu brasileiro? Serei solidário, hospitaleiro, e em tudo dando um jeitinho como ninguém da em todo o planeta? Impossível! Serei mais alegre, descontraído e feliz do que ninguém? Improvável! Terei quadris mais flexíveis? Serei mais malemolente e inzoneiro? Porque serei essas tantas coisas mais do que são persas, afegãos ou capadócios? Enfim, porque me assalto com metafísicas questões, que, talvez sejam, até, irrelevantes? Irrelevantes para quem?

Dúvida cruel, ganga bruta. Porém, a busca continua.

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O CRUCIFIXO

O crucifixo do gabinete da presidência da república sumiu. Dizem que sumiu com a mudança de Lulla. Diziam que Dilma tinha mandado tirar. Hoje dizem que a turma da mudança confundiu-se e tirou. O crucifixo é grande: 2 metros por 80 centímetros; mais a imagem de Jesus. Deve ser muito pesado para tão prosaico engano. Muito estranho. Onde está afinal o crucifixo? Dizem que não cabe no apartamento de São Bernardo, onde elle mora. Muito estranho, vulgar; uma baixaria. Dizem que elle não sabe de nada.

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FALANDO NISSO I

Também dizem que aquele caminhão refrigerado que fez parte do comboio de outros sete do tipo baú da mudança do Lulla, era para transportar 8 mil garrafas de vinho; todas que ganhou de presente ao longo de 8 anos de governo. Vulpino Argento, o Demente, e suplente de senador que soube da notícia fez logo as contas; umas 3 por dia.

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FALANDO NISSO II

Entre os 567 senadores e deputados federais que formam essa nova legislatura, a 54ª da República, mais da metade declarou a Justiça Eleitoral possuir mais de R$ 1 milhão de patrimônio. Entre todos os partido políticos o DEM é o que tem mais milionários. Paulo Magalhães, da Bahia, sobrinho de ACM, declarou ter R$ 14 milhões divididos em 9 fazendas.

Eunício de Oliveira, do PMDB do Ceará, possui R$ 36,7 divididos, entre outros bens, em “imóveis rurais” em Brasília, Ceará, Minas Gerais, e Goiás.

Mas Newton Cardoso, do PMDB de Minas, possui R$ 77,9 milhões em bens. A ex- mulher diz que é mais; entre R$ 2,5 bilhões e R$ 3 bilhões.

De resto, mais da metade do Congresso Nacional é formada por parlamentares com bens superiores a R$ 1 milhão.

Herda e Hosta, irmãs gêmeas ex-censoras, perguntam-se: será que um Congresso de milionários defenderá o povo?

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“A utopia esta lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.” – Eduardo Galeano

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CESAR CABRAL
Enviado por CESAR CABRAL em 08/02/2011
Código do texto: T2779457
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