O que o poeta quer

“E à fã sem nome explico, as flores não se tocam:

vivem pra si e pros passarinhos e pro vento /

Foi por amor o assassinato da flor.”

(O assassinato da flor – CAZUZA)

O que o poeta quer? Ele quer conhecer o mundo por vias desconhecidas, com muita sombra e folhas úmidas cobrindo todo o chão. Ele quer flertar o tempo inteiro com o inesperado. Mas ressente-se do fato de isso ser por demais cansativo e perturbador e duro e anti-paz. Ele anda pela estrada e nada sabe além das suas mil verdades pessoais incompletas. E o mundo... O mundo não está muito longe. O mundo está à frente e abaixo do seu nariz. Bem ao alcance de sua aura de poucos metros de diâmetro. Qualquer florzinha de calçada de bairro é boa para o suas necessidades de beleza, cuja quota diária é sempre uma coisa pequena: poetas não são pessoas exigentes. E aí está o pior. Não desejando ele o impossível, resta-lhe as coisas possíveis, e estas são bem mais pesadas e difíceis que as impossíveis. Abraçar o impossível é da facilidade de um balanço na rede da ilusão. Desejar o possível é mergulhar em mar revolto, em campo de batalha. Não que o poeta seja um soldado voluntário: ele simplesmente não tem escolha. Sua vida é luta. Sua poesia é, ao mesmo tempo, lança e escudo. O poeta é também um pensador de besteiras. Besteiras possíveis. Ele sabe da possível flor no alto da montanha. A flor, filha da semente que viajou no intestino do passarinho que foi passear na montanha, onde ele cagou e vislumbrou o horizonte, e o fez sem um pingo de poesia. A semente, a chuva, o sol, o pequeno caule, o botão, a flor, as cores, a morte. Como essa triste vida é uma coisa bela...

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