32. Alguém que destina o nosso destino quis que eu visse aquele livro de Jorge Semprun
Querida professora, respondendo ao seu mail mais recente, digo-lhe que ontem, quando dei de caras com um livro de Jorge Semprun, tive a sensação de que alguém que destina o nosso destino sabia que eu ia passar pelo jardim da ‘Mairie de Evreux,’ àquela hora, no dia treze de Julho.
E sabia que, primeiro, a leitura do título, ‘L'ecriture ou la vie,’e depois, a leitura de alguns fragmentos de páginas escolhidos ao acaso, como quem lê o livro do Senhor Santo Cristo, me iria fazer querer mudar radicalmente a direcção destas crónicas.
Porquê?
Alguém que não me dei ao trabalho ainda de tratar de saber quem fosse, escreveu na contracapa do livro: ‘(…) ele [suponho que Jorge Semprun] acreditou que seria possível exorcizar a morte através da escrita. Mas a escrita remete-nos para a morte.’
Devo dizer que, pela razão de serem já poucos os que dominam o francês, ainda sou do tempo em que o francês era uma língua obrigatória nos liceus, traduzi à minha maneira o excerto anterior.
E por que razão, o passado deve ficar quietinho lá a um canto do passado? Porque remexer no passado, ao contrário do que se possa pensar, em vez de o resolver, só traz passado a dobrar. E prolongado. Vou deixa-lo sossegado. Num canto. A arrefecer. E vou seguir o meu caminho.
Aliás, dependendo de mim, em meu perfeito juízo, está decidido, não vou escrever mais para apagar brasas, vou escrever para me fazer presente.
Mário Moura
Evreux, 13 de Julho de 2010