GRANDES DILEMAS

Passei o horário do almoço cancelando uma assinatura num zero oitocentos. O atendente, extremamente treinado, tentava me convencer sobre a importância da leitura. O discurso entusiasmado, as facilidades de pagamento e os brindes eram convincentes, mas o conteúdo da revista tendencioso e fraco.

Cheguei atrasada ao trabalho. Entrei no prédio da forma mais discreta possível: com os olhos presos ao chão e o corpo buscando as sombras das paredes... Quando venci os degraus, fui surpreendida por uma reunião distinta: o porteiro, a faxineira, o vigilante e um desconhecido estavam debruçados sobre um papel no balcão da portaria.

“Você vai resolver!”

“Ela sabe...”

O vigilante, com uma postura ereta, fixou o dedo no papel estendido e libertou a questão com ar de autoridade.

“É encentivado ou incentivado?”

Parei com os olhos arregalados e sem entender qual era a dúvida. Os quatro personagens do cotidiano ficaram me observando atentamente. Pensei que poderia ser um jogo de palavras cruzadas, uma carta, uma pegadinha... Sei lá o que pensei, só continuei parada, olhando para eles acuada e com cautela.

Diante de minha perplexidade, desfilavam os olhares curiosos dos funcionários e as pequenas rugas de desconfiança do desconhecido. O vigilante caminhou em minha direção e perguntou novamente de forma mais pausada

“É encentivado ou incentivado?

Estava certa de que se tratava de um interrogatório, talvez devesse confessar que realmente estava atrasada, mas respondi baixinho:

“Incentivado.”

A segurança de nosso vigilante desmoronou. Ele apagou o sorriso na face, enquanto os outros comemoravam calorosamente. O desconhecido exclamava sua vitória com os braços erguidos:

“Viu! Eu falei, não falei!”

O segurança continuou em minha direção e olhando-me com seriedade perguntou-me se tinha certeza.

“Claro! De incentivo!”

A decepção redesenhou a posição de seus ombros e ele, com a cabeça baixa, foi até o balcão e se reuniu com os demais na mesma disposição que estavam quando entrei. Aproveitei a desatenção e caminhei com os passos leves até o elevador. Estava me sentindo culpada, constrangida...

Os dois elevadores estavam no último andar. Permanecemos em silêncio. Mas... Assim que entrei no elevador, ouvi a voz firme do vigilante:

“Tenho certeza que é encentivo!”

“Não sabe nada! Pode ser encentivo... Vai ver que é uma palavra que pode ser escrita de várias formas...”

Flutuei nas ondas de um mar semântico. O que teria estimulado tal questionamento? Seria o entusiasmo pela língua pátria? Quando retornei à terra firme, ainda mareada, busquei a certeza de que só havia aquela forma no dicionário... Quem sabe? Se existe “esmagrecer”, “ponhar”...

Eles tinham dúvidas quanto à grafia, eu, quanto ao significado...

Incentivo... A palavra solta tornava-se apenas num motivo abstrato para passar o tempo num dia chuvoso e ironicamente em inspiração para uma crônica.

Passei o horário do almoço cancelando uma assinatura num zero oitocentos. O atendente, extremamente treinado, tentava me convencer sobre a importância da leitura. O discurso entusiasmado, as facilidades de pagamento e os brindes eram convincentes, mas o conteúdo da revista tendencioso e fraco.

Cheguei atrasada ao trabalho. Entrei no prédio da forma mais discreta possível: com os olhos presos ao chão e o corpo buscando as sombras das paredes... Quando venci os degraus, fui surpreendida por uma reunião distinta: o porteiro, a faxineira, o vigilante e um desconhecido estavam debruçados sobre um papel no balcão da portaria.

“Você vai resolver!”

“Ela sabe...”

O vigilante, com uma postura ereta, fixou o dedo no papel estendido e libertou a questão com ar de autoridade.

“É encentivado ou incentivado?”

Parei com os olhos arregalados e sem entender qual era a dúvida. Os quatro personagens do cotidiano ficaram me observando atentamente. Pensei que poderia ser um jogo de palavras cruzadas, uma carta, uma pegadinha... Sei lá o que pensei, só continuei parada, olhando para eles acuada e com cautela.

Diante de minha perplexidade, desfilavam os olhares curiosos dos funcionários e as pequenas rugas de desconfiança do desconhecido. O vigilante caminhou em minha direção e perguntou novamente de forma mais pausada

“É encentivado ou incentivado?

Estava certa de que se tratava de um interrogatório, talvez devesse confessar que realmente estava atrasada, mas respondi baixinho:

“Incentivado.”

A segurança de nosso vigilante desmoronou. Ele apagou o sorriso na face, enquanto os outros comemoravam calorosamente. O desconhecido exclamava sua vitória com os braços erguidos:

“Viu! Eu falei, não falei!”

O segurança continuou em minha direção e olhando-me com seriedade perguntou-me se tinha certeza.

“Claro! De incentivo!”

A decepção redesenhou a posição de seus ombros e ele, com a cabeça baixa, foi até o balcão e se reuniu com os demais na mesma disposição que estavam quando entrei. Aproveitei a desatenção e caminhei com os passos leves até o elevador. Estava me sentindo culpada, constrangida...

Os dois elevadores estavam no último andar. Permanecemos em silêncio. Mas... Assim que entrei no elevador, ouvi a voz firme do vigilante:

“Tenho certeza que é encentivo!”

“Não sabe nada! Pode ser encentivo... Vai ver que é uma palavra que pode ser escrita de várias formas...”

Flutuei nas ondas de um mar semântico. O que teria estimulado tal questionamento? Seria o entusiasmo pela língua pátria? Quando retornei à terra firme, ainda mareada, busquei a certeza de que só havia aquela forma no dicionário... Quem sabe? Se existe “esmagrecer”, “ponhar”...

Eles tinham dúvidas quanto à grafia, eu, quanto ao significado...

Incentivo... A palavra solta tornava-se apenas num motivo abstrato para passar o tempo num dia chuvoso e ironicamente em inspiração para uma crônica.

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 25/06/2005
Código do texto: T27630