Essas Tais Mulheres

Eram somente cinco, mas, a julgar pelo barulho produzido, o grupo poderia muito bem ser confundido com uma pequena multidão. Embarcaram no já lotado trem do metrô. Amontoaram-se próximo a porta e por ali ficaram. Então, devidamente acomodadas e armadas com a magia que Deus só emprestou para elas – mulheres – começaram a falar, todas ao mesmo tempo, sobre três ou quatro assuntos diferentes.

Sicrana falava com Beltrana que, por sua vez, ponderava com Fulana que, enquanto ouvia, contava um causo para sei lá qual delas. Todas juntas disparando palavras e olhares em direções diversas. Impossível para um simples homem, sem nenhum domínio sobre a tal magia feminina, apreender algo daquele animado disse-que-disse.

Navegavam à vontade na tempestade de palavras por elas mesmas produzida. Enquanto esta gargalhava, a seguinte, fisionomia fechada, ouvia uma terceira que, entusiasmada, elogiava as unhas exibidas por outra. Algumas vezes, como se tudo estivesse previamente combinado, o quadro mudava: a alegria, a seriedade e o entusiasmo, e ainda outros sentimentos, alternadamente, passavam de pessoa a pessoa no grupo. Mesmo assim, no meio da aparente confusão, todas continuavam se entendendo muito bem naquela animada Mini-Torre de Babel.

Tentei imaginar em como se desenvolveria aquela situação em um grupo formado por homens.

Provavelmente, Sicrano tentasse fazer cada um falar na sua vez, Beltrano, fingindo entender alguma coisa ouvida em outro ponto das conversas, riria gostosamente da morte da mãe do Fulano. Logo, com mais alguns minutos, dois ou três deles estariam trocando sopapos, um tentando apartar e outro se afastando fingindo não conhecer ninguém. Com homens, a confabulação terminaria em um grande deus-nos-acuda.

Mas com elas o colóquio seguia que era uma beleza. Bem, na verdade, beleza para elas.

No vagão – a cada parada, mais cheio –, começavam a aparecer focos de revolta. Alguns passageiros davam mostras de irritação com aquele alarido sem fim. Um senhor, elevando voz, lançou um debochado apelo: – Pelo amor de Deus, alguém arranca as pilhas dessas mulheres!

O cara deveria ser um gênio, um mestre na psicologia feminina. Com simples palavras, fez duas coisas quase impossíveis: primeiro, conseguiu fazer que elas se calassem. Está certo que foi por apenas alguns poucos segundos enquanto tentavam descobrir o autor da gracinha, mas, mesmo assim, se calaram. O segundo grande feito do cidadão foi fazer todas falarem uma mesma coisa ao mesmo tempo: “Palhaço!”. Ao qual, uma delas, a mais espontânea, emendou: – Vai catar cocô de pulga!

Ele não foi, é claro, mas simbolicamente pareceu ter ido: na estação seguinte retirou-se para outro vagão.

E assim, contornado o motim, a viagem seguiu em frente. A vida seguiu em frente. E, para desespero de alguns outros passageiros, aquela pequena multidão de cinco graciosas obras da Divina criação também seguiu em frente. Seguiu produzindo um matraquear ainda mais intenso que antes. Sem nenhuma dúvida eram criaturas mágicas. Eram mulheres.

ooOoo

(republicação)

Sykranno
Enviado por Sykranno em 29/01/2011
Código do texto: T2759274
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